Dataprev: justa causa aplicada pela CGU contra funcionário expõe guerra comercial entre revendas Linux

Parecer da Controladoria-Geral da União, que sustentou a demissão por justa causa contra o funcionário da Dataprev José Claudio de Lima de Siqueira, que foi adotada ontem (10) pela estatal, mesmo ainda tendo prazo de 15 dias dado pela própria CGU para o servidor apresentar recurso, é bastante controverso. Não só pela dosagem da pena aplicada, mas pelo fato de expor claramente que há uma guerra política e comercial sendo travada desde 2018 internamente na empresa, entre defensores de revendas Linux SUSE e Red Hat, assunto que ainda ganhará um “terceiro capítulo” com maiores detalhes pelo blog.

O órgão de controle seguiu a decisão do corregedor da estatal, Wesley Ferreira, de não punir o servidor por ter cometido improbidade administrativa, conforme queria Comissão de Sindicância da Dataprev. Mas aceitou “condená-lo” pela prática de condutas que denotam “mau procedimento e desídia no desempenho das funções”.

O então corregedor da estatal, que na realidade era um auditor cedido pela própria CGU, a pedido da presidente do Conselho de Administração da Dataprev, Christiane Edington, não constatou elementos suficientes apresentados pela comissão de sindicância administrativa da empresa, para punir o funcionário por ter cometido algum ato que envolva corrupção.

Outra questão que ficou obscura na decisão foi que num parecer interno da CGU embora não concordassem com a comissão de sindicância pelo enquadramento de José Claudio em improbidade administrativa, decidiram apoiar a decisão nos demais enquadramentos de “desídia” e “mau procedimento”, sem que provas cabais tenham sido colhidas e apresentadas para comprovar os atos praticados pelo funcionário. Tudo pareceu “achismo” da comissão de sindicância, com base em declarações de testemunhas. Não há nenhuma decisão administrativa tomada por José Claudio que pudesse comprovar que ele estava agindo para obter algum lucro com o fornecedor ou favorecimento político interno.

A punição aplicada pela CGU com base na sindicância interna, guarda muita similaridade com um bordão criado na Lava Jato pela esquerda e viralizou na Internet. Aquele em que procuradores, ao acusaram o ex-presidente Lula de ser o “chefe” do esquema de corrupção teriam dito: “não temos provas, mas temos convicções”.

A frase, na realidade, nunca existiu. Os procuradores Deltan Dallagnol e Henrique Pozzobon, fizeram declarações distintas, mas que foram pinçadas do contexto depois para cunhar essa frase ou meme. Dallagnol apenas teria dito que o Ministério Público tinha convicção da participação de Lula. E Pozzobon apenas confirmou o fato de não existir “prova cabal” de que Lula era “proprietário no papel” do apartamento no Guarujá.

Mas a decisão da CGU que pune um funcionário por ser “negligente ou preguiçoso” ou por “mau procedimento” nas atribuições que tinha no levantamento de informações que formariam um edital de licitação, que passou por diversas mãos, mas somente ele está sendo punido, acaba deixando margem para dúvida de que ele é vítima de um processo político.

O enquadramento em “desídia” e “mau procedimento”, embora previstos na Consolidação das Leis do Trabalho para impor uma demissão por justa causa, parecem argumentos frágeis em função dos eventuais deslizes apontados como tendo sido cometidos pelo funcionário, sem provas incontestáveis. No caso de “desídia”, a CGU estaria demitindo por justa causa um trabalhador que tem seis promoções, ficha limpa, que entrou por concurso na empresa e gozava de tanta credibilidade, ao ponto de em julho ter sido nomeado substituto eventual do chefe imediato. Ou seja, não parece um funcionário que tenha problemas de “falta de disposição para evitar qualquer esforço físico ou moral; indolência, ociosidade, preguiça”; ou ainda “falta de atenção, de zelo; desleixo, incúria, negligência”.

Da mesma forma, não parece ser um funcionário que tenha incorrido em “mau procedimento, que seria algo como “comportamento incorreto, irregular do empregado, através da prática de atos que firam a discrição pessoal, o respeito, que ofendam a dignidade, tornando impossível ou sobremaneira onerosa a manutenção do vínculo empregatício”, segundo analistas da legislação trabalhista.

E fica uma indagação: como um único funcionário, de terceiro escalão numa empresa estatal, teria tantos poderes para manobrar internamente um processo de licitação com fins de obter ganhos financeiros pessoais de fornecedores?

O que dá para concluir desta decisão da CGU, que parece ser inédita na Administração Federal: foi criado um precedente – embora previsto em legislação – para agora a controladoria, sempre que achar necessário, avocar para si a tarefa de avaliar processos administrativos e em curso dentro das estatais, passar por cima da diretoria dessas empresas e demitir funcionários, seja por justa causa ou não.

O ideal era que a CGU suspendesse a decisão, mas em contrapartida entupisse a estatal de auditores para investigar a fundo o que ocorreu e ainda anda ocorrendo dentro da Dataprev. O bom nome deste órgão de controle não pode ser maculado por “convicções” criadas por um grupo de funcionários em uma sindicância bem suspeita, que tem como pano de fundo uma briga comercial interna.

*Bom senso e caldo de galinha só toma quem quer.