CGU aplica justa causa em servidor da Dataprev num claro sinal de perseguição política

Está ocorrendo nas entranhas da Dataprev um rumoroso caso de demissão por justa causa, que tem claros objetivos políticos. A direção da estatal se omitiu, não se envolveu diretamente para apurar o caso e tomar uma decisão administrativa. Ao contrário, deixou que a Controladoria-Geral da União interviesse no processo e procedesse o afastamento do funcionário aplicando-lhe a pena máxima. A demissão foi comunicada hoje (09) ao funcionário José Claudio de Lima de Siqueira oficialmente pela estatal, embora a CGU tenha concedido prazo de 15 dias para recurso.

Silêncio covarde

O funcionário é vice-presidente nacional da ANED – Associação dos Empregados da Dataprev, entidade que promoveu uma greve geral em fevereiro 2020 na estatal com o apoio da base sindical, cujo objetivo era lutar contra o processo de privatização da empresa, que culminou com a queda da presidente, Cristiane Edington. Mas a executiva voltou à empresa depois pelas mãos do Ministério da Economia e hoje preside o Conselho de Administração da Dataprev.

A ANED está em silêncio, mesmo sabendo que o seu vice-presidente nacional está sendo demitido por crime que não cometeu. Nenhuma manifestação pública foi feita até agora em defesa do servidor e seu integrante. José Claudio deverá judicializar a demissão, mas está praticamente sozinho, sem o apoio público de ninguém.

O Conselho de Administração da Dataprev comanda a área jurídica da estatal diretamente, inclusive o setor de auditoria. No processo de José Claudio, quem conduziu todos os procedimentos, que são questionáveis, por sinal, foi o auditor da Controladoria-Geral da União, Wesley Ferreira, levado por Christiane para ser o Corregedor da empresa. Outro nome da CGu levado por Christiane foi Augusto César Carvalho Barbosa de Souza, que assumiu o cargo de “Coordenador-Geral de Integridade e Conformidade da Dataprev. Seu passado chegou a ser relembrado por esse blog na reportagem “CGU manda para a Dataprev notório “engavetador” de processos no DNIT“.

Curiosamente, depois que o Corregedor Wesley saiu da estatal e voltou para seu órgão de origem, foi que a CGU resolveu entrar no circuito para tomar as rédeas do processo e demitir o funcionário. Segundo fontes da Dataprev, a decisão foi tomada pela demora do presidente da estatal, Gustavo Canuto de assumir para si o encargo de demitir José Claudio.

Canuto, ao que parece, tomou chá de sumiço. Até agora sua participação no episódio que culminou com a demissão do funcionário, se restringiu a sentar em cima do processo e não dar prosseguimento à ele, obrigando misteriosamente à CGU tomar as rédeas da situação. Não houve até agora nenhuma manifestação pública dele também, ou para concordar com a Controladoria ou para se posicionar contra a decisão da CGU.

Quarto escalão

Mesmo sabendo que o funcionário ainda tem 15 dias de prazo para recorrer junto à CGU dessa punição, a Dataprev parece ter pressa para concluir uma investigação que deveria ter iniciado em 2018. A gerente da Divisão de Gestão Descentralizada de Pessoas – DIDP, Melissa Pasqual Petenon – setor que no organograma da empresa representaria o quarto escalão na esfera de poderes, decidiu afastar imediatamente o servidor, alegando no entanto que irá pagar as “verbas rescisórias legais devidas”. Nenhum outro responsável assina a demissão. Simplesmente José Claudio está sendo demitido por justa causa por uma pessoa que, no organograma da empresa, aparentemente têm funções similares às dele.

Justa causa por “preguiça”?

No último dia 4 de agosto a Controladoria-Geral da União, publicou no Diário Oficial da União a demissão, por justa causa, do funcionário José Claudio Lima de Siqueira. A decisão foi tomada pelo ministro-chefe da CGU, Wagner Rosário, com base num parecer da área técnica da Controladoria nº 139 de 03/08/2022, que avaliou um processo Administrativo em curso na Dataprev.

O processo de nº 00190.110846/2021-08, foi instaurado dentro da estatal em 2021 e logo de cara tem contornos políticos estranhos. Pois somente no ano passado a Corregedoria da Dataprev se deu conta de uma suposta fraude ocorrida numa aquisição pela Dataprev, em 2018, de “subscrições de Suse Linux Enterprise Server e Suse Manager”. José Claudio foi o único responsabilizado pelo processo de compras, embora tal decisão tenha passado por diversas instâncias superiores.

Trata-se do primeiro caso de julgamento de um suposto “ato criminoso” cometido por um funcionário público que não tinha poderes passa assinar sozinho a compra das licenças de software para uma estatal (decisão que inevitavelmente é colegiada, envolve diretores, superintendentes, gerentes assessoria jurídica, etc). E o mais curioso foi que somente ele foi investigado no processo Administrativo. Nenhum diretor, superintendente, gerente de departamento, que tenha aprovado a compra, acabou responsabilizado nessa suposta “fraude”.

Aliás, a decisão de demitir por justa causa o funcionário da Dataprev, que levou ao ministro-chefe da Controladoria-Geral da União a se envolver na questão, não diz claramente que José Claudio Lima de Siqueira tenha, de fato, cometido algum ato que possa ser deduzido como “corrupção”.

O funcionário levou a pena máxima por justa causa, sob a acusação ter infringido alguns itens do “Regime Disciplinar da DATAPREV (N/GP/030/02), e o artigo 482, alíneas “b” (mau procedimento) e “e” (desídia no desempenho das funções), da CLT, uma vez que não observou o dever de exercer com zelo as atribuições do cargo, agiu de forma desidiosa e com mau procedimento”.

Em suma, José Claudio deve ser o primeiro funcionário de empresa estatal a levar uma demissão por justa causa no Brasil, por ter cometido crimes como “disposição para evitar qualquer esforço físico ou moral; indolência, ociosidade, preguiça, falta de atenção, de zelo; desleixo, incúria, negligência”. Mesmo que a licitação tenha sido realizada com êxito. (Este assunto o blog voltará com maiores detalhes).

Ficha impecável

A acusação ao funcionário beira ao absurdo, não pela descrição de eventual falha cometida por ele. Mas pelo fato de José Claudio de Lima Siqueira, que agora está sendo demitido por justa causa, acabara de ser promovido dentro da estrutura organizacional da Dataprev:

E não é somente isso. O agora “preguiçoso” José Claudio, demitido por justa causa, tinha uma ficha funcional na empresa estatal impecável sendo detentor no total de seis promoções em sua carreira na empresa.

Pesos diferentes

Outro fato que chama a atenção nesse processo, é que tanto a CGU quanto a Dataprev, estão demitindo por justa causa um funcionário que até agora não tinha nenhuma conduta digna de alguma punição, mas não foram tão zelosos de suas atribuições legais para punir com o mesmo peso aplicado a José Claudio, no caso do ex-consultor jurídico da Dataprev, José Ivanildo Dias Júnior.

Dentre outro problemas, Ivanildo sofreu processo administrativo na estatal por ter concedido para si e outra funcionária da Consultoria Jurídica, um parecer aprovando o pagamento de viagem e hospedagem pela Dataprev, para participar de curso em Portugal com tudo pago pela empresa. Ivanildo ganhou apenas uma suspensão de 30 dias como punição aplicada pela Dataprev, mesmo tendo dado prejuízos aos cofres públicos. (este assunto o blog também voltará a trata-lo com maiores detalhes em breve).