Governo quer calar a voz dos representantes da sociedade no CNPD

Circula uma proposta de Regimento Interno do Conselho Nacional de Proteção de Dados (CNPD), que tem claros objetivos de evitar a exposição negativa (se houver) da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, diante de temas sensíveis e de interesse da sociedade. A maneira que está sendo encontrada para evitar a possibilidade de sair na imprensa eventuais divergências entre o órgão consultivo e a Autoridade, foi fazer não constar no Regimento Interno proposta de obrigatoriedade das reuniões serem públicas e divulgadas “ao vivo” pela Internet.

No esboço de Regimento Interno do CNPD que está sendo submetido para uma consulta informal entre os membros, está estabelecido que o organismo se reunirá em caráter ordinário três vezes ao ano. E, se necessário, o presidente do CNPD, que será um representante da Casa Civil da Presidência da República, poderá convocar reuniões extraordinárias.

Mas as reuniões serão fechadas e sem acesso ao publico. Não terão o acompanhamento da sociedade, já que não está previsto no esboço do texto nenhum dispositivo que assegure a transparência desses encontros. Informalmente a alegação é que o CNPD tem muitos titulares que consumiriam o tempo dessas reuniões em longos discursos e apresentações entre os seus membros.

Ou seja, a sociedade não poderá saber, por exemplo, se algum conselheiro do CNPD se manifestou publicamente contra a forma da ANPD se comportar diante do cenário da proteção de dados do cidadão brasileiro. Além disso, ninguém poderá saber também, que interesses estão defendendo os eventuais lobistas de empresas que participam do órgão travestidos como “conselheiros”.

Independentemente de terem “faladores” demais ou não no CNPD (como se já não falassem diariamente nas redes sociais), impedir o acesso público às reuniões do Conselho não será uma prática salutar para a transparência desse organismo que tem a missão de ser apenas consultivo. Até porque, fere o que está previsto no Artigo 29 do Regimento Interno da própria ANPD, que é obrigada a promover reuniões “públicas e transmitidas em tempo real pela página na Internet”.

Até o momento não houve nenhuma reunião pública deliberativa transmitida “ao vivo” pela ANPD . Apenas uma consulta pública ganhou a transmissão pela Internet. Após um ano de funcionamento, completados no dia 6 de novembro do ano passado, a ANPD ainda não “deu as caras” ao público em geral, costumeiramente chamado de “povo brasileiro ou contribuinte”.

Foram realizados neste período 15 Circuitos Deliberativos, nenhum deles “ao vivo” pois esse tipo de reunião costuma ser feita pelo telefone ou outro meio de comunicação, sem a necessidade da presença física dos diretores. Como resultado, esses encontros informais da ANPD geraram a publicação de 17 Portarias e foram celebrados 4 “Acordos de Cooperação Técnica”. Mas todos só tiveram publicidade após os encontros sem nenhum indício de divergência interna ou outro tipo de problema. Se alguém divergiu e criticou a decisão, nunca saberemos. Convém lembrar que a direção da ANPD é formada por três militares escolhidos à dedo pelo Palácio do Planalto (leia-se GSI da Presidência da República); uma advogada e uma técnica do governo, cujos currículos (excelentes) estão diretamente ligados com o tema proteção de dados. Os militares estão mais voltados para a área de Segurança da Informação.

Ata

No Caso do Conselho Nacional de Proteção de Dados, o máximo que se pretende fazer sobre as reuniões será publicar uma “Ata da Reunião” 30 dias após a realização delas. E nessas Atas que não passam de um resumo do encontro, que normalmente registram apenas os temas discutidos, não será possível conhecer a opinião dos seus integrantes e se houve divergências internas e posicionamentos contrários a determinados temas polêmicos.

Nem mesmo críticas à atuação da ANPD não serão de conhecimento público. As Atas apenas registrarão algo negativo para a imagem da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, caso algum conselheiro do CNPD insista para que o seu posicionamento esteja registrado publicamente em Ata.

E isso é ruim para a transparência pública de um conselho consultivo, que já peca em representatividade. O Conselho Nacional de Proteção de Dados (CNPD) será formado por cinco representantes do Poder Executivo, dois do Legislativo (Câmara e Senado), dois do Poder Judiciário (Conselho Nacional de Justiça e Conselho Nacional do Ministério Público), apenas um representante do Comitê Gestor da Internet (CGI.br), três da Sociedade Civil, três das instituições científicas, tecnológicas e de inovação, três das confederações dos setores produtivos, três dos setores empresariais (sindicatos patronais que tenham ligação com tratamento de dados pessoais) e apenas dois representantes do setor laboral.

*Resta saber se os integrantes do CNPD preferem ficar calados ou se estão lá para representar legitimamente e publicamente os interesses da sociedade e de quem confiou em suas reputações e os indicou.