O conto do “rombo” das estatais de TI/Telecom (ATUALIZADA)

Paulo Guedes

Reportagem da TV Globo publicada no feriado sobre um rombo nas empresas estatais, que levará o governo a ter de por quase R$ 6 bilhões para cobrir essa conta, foi um misto de preguiça de apuração e edição de imagens, misturado com desinformação. Há estatais que não deveriam existir e só dão prejuízo? Sim é óbvio que sim. Mas algumas das citadas na reportagem sequer apresentaram prejuízos nos últimos seis anos. Portanto, não deviam figurar numa reportagem que trata de rombo nas contas de empresas públicas. Foi o caso do Serpro e da Dataprev, que ainda tiveram as fachadas de suas sedes mostradas injustamente na reportagem do JN.

“O Serpro não é uma empresa pública deficitária. Pelo contrário, temos projeções para ao final do exercício de 2023 de resultado líquido em torno de R$ 402 milhões e superávit orçamentário acima de R$ 500 milhões, ou seja, o desempenho econômico-financeiro do Serpro contribuirá positivamente para o alcance das metas fiscais por meio da distribuição de dividendos”, informou a estatal em nota oficial distribuída pelas redes sociais.

A Dataprev também emitiu no final da tarde de hoje, na qual a empresa informa que a expectativa financeira para 2023 é de um lucro próximo a R$ 500 milhões, e um resultado primário positivo de R$ 26 milhões. “A perspectiva da empresa para 2024 é de crescimento, com investimentos em modernização e expansão da capacidade de infraestrutura física e tecnológica para melhoria dos serviços públicos”, informou, lembrando ainda aos leitores que nunca dependeu de recursos do governo federal. A Dataprev gera receita própria com serviços prestados ao setor público, além do serviço de validação do crédito consignado para bancos e no pagamento dos benefícios sociais.

Portanto, não se tem nenhuma ideia de onde teria partido a previsão descrita na reportagem do Jornal Nacional, de que a empresa projeta anunciar um rombo nas próximas contas da ordem de R$ 200 milhões. Se foi do Tesouro Nacional, seria recomendável mostrar claramente esses números.

Rapinagem

Curiosa na reportagem do JN, foi a forma como o veículo explicou que as estatais deram tanto prejuízo aos cofres públicos, que durante o Governo Temer o Tesouro Nacional foi obrigado a cobrir o rombo com R$ 5 bilhões e que no Governo Bolsonaro essa conta disparou para R$ 10 bilhões. No que tange as estatais de TI e a Telebras, isso soa como uma inverdade.

O que foi feito na época deveria ter sido chamado de “caso de polícia”. Mereceria ter sofrido uma investigação do Ministério Público Federal e dos organismos de controle. Mas essa turma dorme em berço esplêndido já há quase uma década. Não são nem sombra do que já foram como fiscalizadores das contas públicas.

Tanto o Serpro quanto a Dataprev, durante os governos Temer e Bolsonaro, passaram por um processo de enxugamento, uma “lipoaspiração” completa para perder toda a gordura que tinham em suas contas de custeio. Enquanto isso, as direções das duas estatais também represavam o orçamento de investimentos que recebiam a cada ano, deixando as empresas praticamente paradas em novos projetos que exigissem aumento de sua infraestrutura de TI.

A telebras, por sua vez, enquanto aguardava uma definição se seria ou não vendida, o Ministério da Economia a colocou como uma “estatal dependente” do Orçamento Geral da União, apesar de sua condição de sociedade anônima, com um pequeno número de investidores privados. Tal decisão do ministro Paulo Guedes represou no caixa da empresa a bagatela de R$ 1 bilhão (à preços de hoje), que ficou proibida de lançar mão para as suas necessidades operacionais.

A razão para a adoção dessa postura do Ministério da Economia com as estatais de TI e Telecom era simples: privatizações.

As duas empresas enxugaram pessoal e rescindiram contratos e pouco investiram nos últimos seis anos. A ideia era reduzir eventual passivo nas contas do custeio da empresa, para poder entregá-la ao futuro comprador equilibrada financeiramente. Na Dataprev, por exemplo, a direção extinguiu diversas regionais e somente não colocou todos os funcionários no olho da rua porque houve pressão sindical e greves que impediram esse movimento.

No caso dos investimentos, as duas empresas sempre tiveram orçamentos em torno de R$ 200 milhões, cada. Mas o dinheiro praticamente ficou represado dentro das estatais. Não por falta de ideias sobre no que investir, ou de melhorar o seu desempenho operacional. Muito menos por alguma política pública ter deixado de ser implementada.

O dinheiro ficou parado no caixa das estatais, porque era uma manobra do Ministério da Economia para premiar os futuros compradores das estatais de TI na privatização. Um escândalo que acabou não se concretizando porque elas não foram vendidas. Mas se tudo tivesse corrido conforme o ministro Paulo Guedes desejava, tanto o Serpro quanto a Dataprev teriam sido vendidas por uma bagatela, mas retornado ao caixa dos compradores algo em torno de R$ 1,5 bilhão em dinheiro represado de investimentos que não foram feitos nessas companhias.

Temer colocou R$ 5 bilhões no caixa de todas estatais e Bolsonaro dobrou o valor. Indaga-se: por que teriam feito isso, se a ideia era vender as empresas e se livrar desse problema?

*O JN, ao que parece, estava mais preocupado em mostrar imagens de fachadas de empresas públicas de TI, do que tentar entender como governos repassaram R$ 15 bilhões para empresas que seriam vendidas.