Após seis meses de tentativas frustradas, técnicos da Dataprev continuam batendo cabeça para acomodar solução de nuvem da Microsoft, incompatível com o ambiente open source da estatal.
Solução que a ex-presidente da Dataprev, Christiane Edington, contratou em dezembro do ano passado, depois de uma licitação esquisita. O pregão consagrou a vitória para uma empresa de telefonia, que teve a façanha de bater em preço as principais revendas da multinacional no Brasil.
Migração temerária
Funcionários da Dataprev têm relatado a este site as suas preocupações com esse processo. Segundo eles, atualmente os técnicos da estatal estão sendo obrigados a realizar às pressas a migração da sua plataforma open source de autenticação de usuários LDAP (Lightweight Directory Access Protocol) nos três datacenters que dispõe, para a ferramenta AD (Activy Directory) da nuvem da Microsoft.
Isso significa que todos os sistemas da Dataprev que migrarão para a nuvem da multinacional precisam ser atualizados para o novo ambiente. Estima-se que sejam mais de 700 sistemas, cada um com tabelas de permissões gigantescas, indicando o nível de acesso do usuário e o que cada um pode ou não fazer ao acessar um sistema.
É tarefa que demanda tempo, muitas horas de computação para esses técnicos. Não dá para fazer isso a toque de caixa. Em outros organismos federais migrações de plataformas teriam ocorrido em prazos que chegaram a dois anos de trabalho intenso. Mas a Dataprev quer fazer isso agora em poucos meses por determinação da atual diretoria.
E tudo num momento que a área responsável ainda tem de dedicar parte do seu tempo para prestar serviços ao seu maior cliente, o INSS, além de enfrentar desafios diários que a pandemia do Coronavírus vem impondo nos serviços que presta junto ao Ministério da Saúde, ao Ministério da Cidadania, além da Caixa Econômica Federal.
As consequências futuras de uma migração feita na correria poderão ser a
indisponibilidade de sistemas (o famoso “tá fora do ar”) e a concessão de acessos indevidos para quem não deveria ter permissão.
E sabe-se lá o que poderão fazer em ambientes que não deveriam ter permissões para frequentar, numa estatal que volta e meia é acusada de favorecer quebras de segurança que permitem quadrilhas atuarem nas fraudes contra a Previdência Social.
Volta adiada
Christiane Edington, responsável direta por essa confusão na Dataprev, teve a sua nomeação para o Conselho de Administração da estatal misteriosamente adiada. Estava prevista para ocorrer esta semana, mas a avaliação do assunto pelo Conselho acabou adiada.
Depois de ter saído em março deste ano da empresa, deixando para trás um rastro de supostas irregularidades que estão sendo analisadas pela Controladoria-Geral da União, ela ganhou o apoio da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional para retornar para a empresa, por inspiração do ministro da Economia, Paulo Guedes.
O órgão é apontado como sendo autor de um parecer jurídico que garante o retorno de Christiane, inclusive para ocupar a presidência do Conselho de Administração da empresa. Um caso raro em tão curto período de tempo entre a exoneração dela do cargo de presidente da Dataprev, e agora o seu suposto retorno ao Conselho de Administração.
E numa situação bastante peculiar: ela comandará a Auditoria Interna e Estatutária da estatal, a mesma que está tendo de se desdobrar para atender aos pedidos de informações de auditores da CGU que investigam a sua gestão. Até um técnico da CGU já foi nomeado para cargo na empresa em circunstâncias bastante estranhas.
O próprio contrato com a Microsoft terá de ser explicado ao órgão de controle. A empresa já estava realizando o processo de contratação da revenda e somente alterou sua Política de Segurança da Informação quando já se sabia quem venceu o certame. Um precedente incomum, pois a empresa queria uma solução que sequer estava em conformidade com a sua política interna.
O atual presidente da Dataprev, Gustavo Canuto, tem se comportado como uma espécie de “rainha da Inglaterra”, pois desde que assumiu o cargo não conseguiu mudar praticamente ninguém da equipe de Christiane, nem na diretoria da empresa.
O adiamento da nomeação dela ocorreu justamente no momento em que o Tribunal de Contas da União iniciou investigações sobre suposto tráfico de influência denunciado na imprensa contra a Globalweb, empresa que teve contrato cancelado e depois renovado pela diretoria da Dataprev na sua gestão. O que Christiane Edington teria a dizer ao tribunal sobre o caso, se tivesse sido efetivada sua nomeação no Conselho de Administração?