O grande ausente num evento que envolveu a OCDE

A Secretaria de Governo Digital do Ministério da Economia, comandada pelo “CIO” do governo, Luis Felipe Monteiro, foi a grande ausente ontem (26) no evento que a OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – apresentou os indicadores de revisão da estratégia digital e da situação das redes de Telecomunicações e de Radiodifusão no Brasil.

Nem ele, nem outro membro qualquer do Ministério da Economia estiveram presentes, pelo menos não como protagonistas. Por que?

Festejou tanto nas redes sociais há seis dias, quando o Brasil apresentou melhora no seu desempenho de digitalização. Por que deixou de capitalizar para si e o Ministério da Economia esse feito, que na realidade começou em 2018, no Governo de Michel Temer, segundo a própria OCDE?

Podem alegar que o evento era para “ministros”, o primeiro escalão do governo. Mas aí é de se perguntar: o que estaria fazendo lá, sentado na mesa central, dos ministros, o presidente da Anatel, Leonardo Euler de Moraes?

É muito estranho que nenhum representante do Ministério da Economia esteja presente. Assim como não se deve levar ao pé da letra que o Brasil esteja em posição tão privilegiada perante a OCDE no tocante à digitalização e na área de Comunicações. Que facilitará a sua entrada na entidade. Tem muito chão pela frente.

Segundo a OCDE, o Brasil vem se comportando bem, tendo progressos, mas que ainda estão longe da média da organização. Vem apontando crescimento no tráfego de Internet, que aumentou em 50% com o confinamento imposto pela pandemia do Covid-19. Também houve uma melhora no acesso à Internet, com 70% de acessos desde 2018. Em 2006, segundo a OCDE, esse acesso estava na casa dos 26%. A organização também viu melhora na banda larga móvel, e entre 2012 e 2019 a assinatura triplicou no Brasil. Também destacou a aprovação de marcos regulatórios que asseguram, inclusive, a proteção de dados, citando o papel do CGI.br nesse contexto. Entidade que nunca vi o Ministério da Economia consultar.

São fatos que podem ser comemorados, mas como esforços de governos, e não apenas deste. Mesmo assim, os indicadores ainda mostram que o Brasil ainda está longe do padrão da OCDE, embora esteja no caminho.

Por exemplo, a entidade constatou que em 2018 um quarto da população brasileira ainda não tinha utilizado a Internet.

As microempresas brasileiras estão aquém das empresas da OCDE no uso das tecnologias digitais. Segundo a organização, apenas 54% das empresas com 10 empregados tinham sua própria página na Internet em 2019. Em comparação com a OCDE ainda é baixa (78%).

Embora tenha 90 assinaturas de banda larga móvel por cada 100 habitantes, o Brasil, que não está muito longe do padrão da OCDE, ainda tem penetração da banda larga fixa pequena, de apenas 15%, ou a metade da média dos países que compõem a organização (31,4%). Nas velocidades de conexão o Brasil também deixa a desejar, com apenas 4,8Mbps, enquanto que a média da OCDE é de 26,8 Mbps.

Talvez o Ministério da Economia tenha preferido não estar presente num evento que fez questão de divulgar, na parte que lhe interessa, justamente porque não quis ouvir da organização as recomendações que recebeu para melhorar o processo de digitalização do Brasil:

1 – Todo o governo deve adotar em conjunto a estratégia de Transformação Digital aprovada em 2018 e já revisada em 2019.

2 – Maior presença do Comitê Interministerial de Transformação Digital (que eu nunca vi funcionando), o que significa que não caberia somente ao Ministério da Economia definir os rumos desse processo no Brasil, estabelecendo políticas sem ouvir o governo como um todo.

3 – Conexão confiável e acessível ($) para todas as famílias no Brasil, implementando ainda mais a sua infraestrutura de redes de fibras (backbone e backhaul), que é pequena. Embora não seja problema direto do Ministério da Economia, este tem interferido na solução, ao manter pressão pela privatização da Telebras, por exemplo. Mesmo caso, quando pediu atenção para a proteção de dados dos cidadãos, caso venha a vender o Serpro e a Dataprev.

Mas um item que chamou a atenção no evento foi quando Angel Gurría, Secretário Geral da OCDE, declarou que a “confiança é a base necessária para a transformação digital” e que a Lei Geral de Proteção de Dados é um importante passo nessa direção.

E como golpe final, a OCDE afirmou que a transformação digital deve andar de “mãos dadas com uma transformação fiscal”, com uma harmonização da tributação nos serviços de telecomunicações.

Ou seja, ficou a impressão de que a ausência do Ministério da Economia e de seu “CIO”, seguiu a máxima de que, “o que é bom se comemora e o que é ruim finge que não aconteceu”. Deixaram para outros ministros não diretamente ligados ao assunto ouvir as “recomendações” da OCDE.

Ou será que a turma de Paulo Guedes nem foi convidada a participar do evento e a Economia agora é regida pela Casa Civil da Presidência da República?

*Mistério.