Coluna de domingo: o caos administrativo da ANPD

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), terá um orçamento este ano de R$ 28 milhões, para cumprir as suas funções previstas na Lei Geral de Proteção de Dados. Chegou a ter R$ 40 milhões de orçamento cedido pela Casa Civil da Presidência da República, quando era vinculada à essa pasta entre 2022/2023. Mesmo assim, já era um orçamento irrisório para uma Autarquia com o tamanho da responsabilidade que tinha.

Desde que foi transferida neste governo para o Ministério da Justiça, a ANPD softre de crise de identidade e credibilidade. O seu presidente, coronel Waldemar Gonçalves Ortunho, nunca foi recebido pelo ex-ministro Flavio Dino. Pelo menos não houve nenhum registro público de tal encontro. Se tal ocorreu, foi mal divulgado até mesmo pela Autarquia. Não se sabe agora se na gestão do novo ministro Ricardo Lewandowski, o presidente da ANPD e demais diretores serão recebidos. Nem mesmo na Secretaria de Direitos Digitais a direção da ANPD foi recebida. A impressão que se tem é que ambos os lados no governo não têm nenhum interesse de conversar.

Hoje o governo trabalha com o seguinte cenário, se quiser mudar a direção da Autarquia, nomeada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e composta por três militares e duas civis. 1- Waldemar Ortunho e os demais diretores só saem da ANPD por vontade própria, renunciando os seus mandatos. Ou por mudança legislativa, com o envio de uma Medida Provisória ao Congresso. Outra alternativa seria baixar um decreto federal na qual seria mudada a estrutura administrativa da ANPD. Até agora o governo não se mexeu em nenhuma direção, o que já levanta suspeitas de que dentro do Palácio do Planalto há quem prefira deixar a LGPD e a Autarquia no limbo jurídico/administrativo, para não “prejudicar o mercado”.

Sem dinheiro, a ANPD empurra com a barriga as suas atividades de fiscalização. Não tem equipe para isso, nem pode contratar no mercado quem possa fazer o serviço de auditagem das denúncias que recebe. O resultado são decisões pífias contra empresas e organismos públicos, muitas baseadas em denúncias da imprensa. Alguém já viu algum fiscal da ANPD visitando empresa ou órgãos federais para auditar os sistemas e conferir eventuais vazamentos de dados? Ou pelo menos se tais entes estão em conformidade com a LGPD?

Já existem denúncias de que ninguém consegue parar na ANPD. Que no último ano a Autarquia teria perdido até 19 colaboradores, que preferiram retornar aos seus órgãos de origem ou partir para outros onde tenham melhores condições de trabalho. Isso influi tal ponto nos resultados, que hoje a ANPD por absoluta falta de pessoal até vem recusando as reclamações que titulares de dados fazem contra empresas e organismos públicos.

Aos olhos do mercado já existem críticas contundentes sobre o papel da ANPD e elas se traduzem da seguinte forma:

1- A Autarquia vem economizando nos seus gastos para poder se manter dentro dos orçamentos pífios que são previstos pelo Congresso Nacional. Que aprovou a LGPD e a criação da ANPD, mas não deu os instrumentos financeiros necessários para ela exercer as suas atividades. O Poder Executivo, por sua vez, não se interessa pelo organismo, já que não pode substituir a direção. O processo é desgastante, pois demandaria buscar apoio no Legislativo e o governo evita entupir sua pauta com assuntos que considera “irrelevantes”. 2 – Sem poder mostrar os dentes, já existem rumores de que há casos de ⁠maquiagem de incidentes de segurança, com distorções propositais de avaliações de risco feitas pelas empresas para não terem de notificar nem a ANPD, nem os titulares. Preferem mentir que, pela falta de adequação à LGPD, acabaram deixando vazar dados ou trataram essas informações de forma errada.

3 – Empresas simplesmente estão evitando contato com a ANPD, tamanha a falta de credibilidade da direção dela. Empresas que antes queriam apresentar sua governança, mostrar que estão cumprindo a legislação vigente e ganhar uma imagem positiva no mercado, agora preferem se manter à distância, não tendo contato com a autarquia. Há até mesmo um certo ⁠desprezo sobre as orientações públicas da ANPD. Os profissionais designados pelas empresas para cumprirem à risca a LGPD – mais maduros que os servidores da Autarquia – acabam discordando das posições técnicas da ANPD e optam por seguir orientações europeias.

Há inclusive uma razão para essa orientação de seguir o que os europeus recomendam em termos de proteção de dados pessoais. As empresas brasileiras buscam essa alternativa porque temem que a União Europeia considere que o Brasil não está adequado em nível de proteção de dados exigido por eles lá fora. Neste caso as empresas podem ser impedidas de tratarem os dados de cidadãos europeus em solo brasileiro e ainda poderiam vir a sofrer sanções no exterior por não observarem o que rege aquela legislação estrangeira.

*A ANPD é como sempre digo, não passa de um “tigre de papel”. Para ficar como está, melhor seria nem existir.

Sugestão

Quem for ter audiência com o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, para pedir alguma coisa ao governo, comece logo na entrada do gabinete elogiando a entrevista dele para as páginas amarelas da revista Veja. Juscelino não cabe de tanta felicidade de ter aparecido na revista e quando lembrado por alguém sobre essa “façanha”, seus olhos chegam a brilhar. Mas convém pelo menos dar uma passada de olho nessa entrevista. Vai que ele pergunte: “qual foi a parte que você mais gostou”?

“Na chón”

Bastou a discussão sobre uso do satélite para conectar escolas públicas ir parar nas mãos de Arthur Coimbra, do Conselho Diretor da Anatel, que um “milagre” aconteceu. O custo estimado pelo grupo comandando pelo também conselheiro, Vicente Aquino, chegou a ser de R$ 1,033 bilhão para conectar 8.365 escolas no Norte e Nordeste do país. Coimbra disse negativo e manteve a regra de só conectar com satélite a maioria das 5.432 escolas que ficam na Região Norte, onde não há infraestrutura terreste. Coimbra decidiu que o custo total será de R$ 653,9 milhões. Valor menor até mesmo que o estimado pelo grupo de Aquino para a região Norte, que e foi R$ 686,7 milhões. Coimbra simplesmemte aplicou a lógica: escola em área onde tem possibilidade de uso de fibra óptica, que seja conectada com essa infraestrutura de rede.

*Vai por mim, não foi só o pessoal do Elon Musk, na Starlink, que ficou “p” da vida com a decisão do conselheiro Arthur Coimbra.

As “torres” da Oi

Volta e meia a Oi anuncia a venda de alguma ativo no seu processo de recuperação judicial, sendo que alguns ela nem tem. Por exemplo, em dezembro de 2022 a Oi e a empresa Highline divulgaram os termos de um grande negócio. A Oi decidiu vender suas 8 mil torres no valor total de R$ 1,697 bilhão para a Highline. Deste motante, R$ 1,088 bilhão foi pago no fechamento do acordo comercial. Já o restante, R$ 609 milhões, seriam pagos até 2026. Seriam, pois somente agora foi que a Highline, depois de pagar o principal e fechar o acordo, resolveu conferir a situação das 8 mil torres que comprou da Oi. E descobiu que a maior parte era TUP (ponto de Telefone de Uso Público, os famosos orelhões), ou a torre já tinha caído ou nem existia. Um tremendo mico.

As “torres” da Oi (2)

Insatisfeita com o cano que levou, a Highline bateu na porta da Anatel para pedir que a agência repasse para ela todo o dinheiro (os R$ 1,697 bi) da negociação que foi bloqueado pela agência. Decisão tomada porque as supostas torres são um bem reversível, que só poderiam ser vendidas pela concessionária para reutilizar o dinheiro em melhoria de serviços na rede fixa. E assim mesmo, isso ainda dependeria da anuência prévia do TCU. A Highline saiu cabisbaixa, de mãos abanando da agência reguladora, que deixou claro que não pretende se meter em briga ou cano comercial de empresas privadas.

Nas graças dos petistas

Cristina Boner não cabe de tanta felicidade. Conseguiu se livrar da imagem de “empresa de bolsonarista”, com a presença da filha na Globalweb. Já sonha em prestar serviços no Banco Central com outra empresa do grupo na implantação do DREX, tal como já fez com o PIX. Basta a Dataprev não atrapalhar os sonhos dela aplicando uma inidoneidade e multa de R$ 27 milhões por serviços não prestados. Mas até aí tudo bem, Cristina sabe que contrato assinado no governo PT, multado no governo do seu “mito” Jair Bosonaro, não há de morrer desse jeito em um novo governo petista. Eles sempre se entendem!

Cachimbo da paz

A direção da Federação Assespro já fez as pazes com o presidente da Dataprev, Rodrigo Assumpção. Já realizou uma audiência para se explicar e dizer que não quis bater na estatal por conta do contratão que ela assinou com o Ministério da Gestão. Foi só ciúmes, por não verem as empresas privadas pondo as mãos nessa grana, mas tudo bem. Sempre tem o Serpro para dar uma forcinha, né?

Por falar em Serpro

Alguém sabe dizer se a estatal ainda está operando a pleno vapor ou já virou brisa? Já conseguiu resolver na diretoria quem é o presidente?

Barcelona, meu cantinho

Todo ano após o Carnaval vem aquela viagem de ouro para Barcelona, na Espanha. O pessoal envolvido com Telecomunicações no governo se esbalda, pois ninguém é de ferro. Que o Ministério das Comunicações, a Anatel e até o MCTI ou o Ministério do Desenvolvimento, a Apex e ABDI, se desloquem em peso para a Espanha para participar do “Mobile World Congress 2024 (MWC 2024)”; vá lá. Negócios são prospectados e o povo pelo menos conhece um pouco de inovação no setor, coisa que este país não faz. Mas alguém pode me explicar o que um diretor da Aneel, a agência de energia elétrica, pretende fazer em Barcelona? No despacho a justificativa é que o vivente irá fazer “representação Institucional no evento e reunião setorial com TelComp e Softex”.

*Não saía mais barato para os cofres públicos, se reunir no Brasil com a Telcomp e a Softex?

Meu hacker, minha vida

O Supremo Tribunal Federal está com pressa. Decidiu abrir um edital para contratação de empresa de segurança cibernética por R$ 3, 7 milhões. Tem cara de contrato emergencial, pois está barato demais. Deve ser só para não deixar algum buraco, enquanto a coisa não engrossa nas contas do STF. Quem vencer o pregão terá de fornecer “solução de detecção e resposta estendida a incidentes de segurança cibernética, serviços de monitoramento, prevenção, detecção e resposta a ameaças de nova geração”. Brincadeiras à parte, o STF em 2022 conteve 2,4 milhões de ataques ao ambiente tecnológico da Corte. A turma do Bolsonaro andou bastante ativa.