Nuvem do Serpro saiu 100 vezes mais cara para o TST. Por que?

Ao anunciar ontem (14), que está fechando um contrato de prestação de serviços em multinuvem com o Tribunal Superior do Trabalho (TST), no valor de R$ 2,3 bilhões (a ser pago de acordo com a demanda em cinco anos), o Serpro acabou mostrando que o preço saiu 100 vezes mais caro para o tribunal, se comparado ao contrato que a Corte já manteve com a nuvem federal controlada pela Secretaria de Governo Digital (SGD).

Por 24 meses o TST operou um contrato de R$ 28 milhões com a nuvem federal da SGD, que é um órgão vinculado ao Ministério da Gestão, Inovação e Serviços Públicos. Qual o motivo para essa discrepância? Somente o Serpro e o TST poderão esclarecer mostrando o teor dos contratos.

Mas aparentemente não há nada de novo que justifique um valor tão alto. A única vantagem que talvez possam alegar, a grosso modo, seria o fato de o TST estar migrando as suas bases de dados para um “ambiente estatal”. Ainda que o “Broker” (integrador) seja a empresa pública, a infraestrutura do eventual provedor escolhido para operar a nuvem do TST será de uma multinacional. O Serpro opera sua multinuvem ofertando infraestrutura e diversos serviços da IBM Cloud, Azure (Microsoft), Huawei, Oracle, AWS e Google Cloud.

“A parceria com o Serpro fortalece a governança, reduz riscos e assegura a continuidade operacional, especialmente diante da crescente informatização dos serviços públicos com especial atenção às necessidades da Justiça do Trabalho”, declarou à Comunicação da estatal, o presidente do TST e do CSJT, Aloysio Corrêa da Veiga.

Será realmente que há tanta diferença ter as bases de dados numa empresa estatal que se vale de infraestrutura multinacional, ou num órgão ministerial que também opera a mesma multinuvem, com a maior parte dos mesmos parceiros tecnológicos do Serpro?

Um dos motivos alegados para esse custo seria a possibilidade de o contrato com o TST franquear a entrada para outros 24 tribunais regionais na multinuvem do Serpro. Que poderiam contar com os mesmos serviços de armazenagem dos dados e as novas aplicações a serem desenvolvidas para o meio jurídico. Mas a nuvem federal da SGD também abria essa possibilidade para os mesmos tribunais regionais do Trabalho. Bastaria que elas aderissem à Ata de Registro de Preços da Secretaria de Governo Digital.

Também não procede a desculpa de que o contrato será por cinco anos e daí o custo anual ser bem maior, em torno de R$ 460 milhões/ano. O contrato do TST com a SGD era por dois anos, e somente gerava um custo anual de R$ 14 milhões. Por que tamanha discrepância em serviços aparentemente similares?

Em resumo, não fazem tanto sentido essas alegações para o tribunal ter optado por acomodar as suas bases no Serpro ao custo de R$ 2,3 bilhões por cinco anos, deixando de lado um contrato com preço de R$ 28 milhões, na Secretaria de Governo Digital.

A única diferença vísivel seria o integrador. Enquanto o Serpro atua como o “Broker”; na multinuvem da SGD o serviço ficava à cargo da empresa privada Extreme Digital Solutions (EDS), que provavelmente assinou contrato com diversas salvaguardas para a proteção de dados.

“Esse movimento reforça o papel do Serpro como parceiro do Estado na oferta de soluções que unem eficiência, segurança e inovação”, declarou o presidente da estatal, Alexandre Amorim. “O acordo evidencia a confiança das instituições em nossa capacidade de entregar soluções estratégicas e contribuir diretamente para a modernização do Judiciário”, complementou Ricardo Giachini, gerente na Superintendência de Negócios Estratégicos do Serpro.

Resta saber que “soluções estratégicas” terão efetivamente a etiqueta da estatal, e quais serão apenas soluções ofertadas pelas multinacionais em seus catálogos, que acabarão customizadas pelo Serpro para o ambiente de TI do TST. Convém lembrar que a estatal acabou com a sua área de desenvolvimento de softwware, optando em ter duas diretorias voltadas para “negócios”, reaproveitando os seus analistas para elas.

*O episódio mostra algumas questões ainda mal resolvidas dentro do governo em relação aos serviços de infraestrutura de nuvem, seus preços e o confuso discurso da soberania digital. Coisas que costumeiramente ocorrem em países consumidores de tecnologia.

Após essa publicação, o Serpro encaminhou uma contestação às informações desta matéria, que ainda terão uma resposta do blog. Segue a contestação