Por Dane Avanzi* – O papel das redes sociais na sociedade moderna voltou a ser tópico de discussão recentemente, após o lançamento do documentário “O Dilema das Redes”, da Netflix. A produção alerta para o perigo de algoritmos que sabem mais sobre nós do que nós mesmos e plataformas digitais que se tornam cada vez mais viciantes para ganhar nosso tempo e nossos dados.
O documentário em si não apresenta nenhuma novidade para usuários mais atentos. Quer dizer: muitos já sabiam que as redes sociais coletam dados de usuários para que empresas possam veicular anúncios com maior assertividade de compra. O modelo de negócios gratuito basicamente indica que, se você não paga pelo produto, quem está sendo comercializado é você. Além disso, já vimos o impacto que as redes sociais tiveram na disseminação de fake news e na popularização de discursos de ódio. A questão agora é: com todo esse conhecimento em mãos, o que mudará efetivamente para os usuários?
Neste ano, o Brasil e o mundo foram atingidos por uma pandemia sem precedentes. A Covid-19 se tornou mais um objeto de polarização política e campanhas de desinformação. Em maio, por exemplo, uma imagem de um caixão aberto com um travesseiro dentro viralizou nas redes sociais, denunciando que caixões vazios estavam sendo enterrados no Amazonas. À época, o Estado tinha a maior taxa de mortalidade por coronavírus no país. A mentira levou famílias a exigirem a abertura de caixões de entes mortos pela Covid-19, causando uma ferida emocional ainda maior.
O papel de prefeitos e governadores no que diz respeito ao controle da pandemia também foi alvo de fake news, especialmente depois que o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou a autonomia dos Estados e municípios para definir regras sobre isolamento.
Apesar da pandemia, não podemos nos esquecer de que 2020 é ano de eleições municipais. Como assistimos nas eleições anteriores, como nos Estados Unidos, em 2016, e em plebiscitos importantes, como o Brexit, o papel das mídias sociais será decisivo. Acredito que a questão passa pelo bom discernimento do eleitorado. Procurar conhecer o candidato além das redes sociais, verificar seu histórico e, o principal, se possui qualificações para o cargo. Não me refiro à diploma somente, o que é bastante desejável, mas sobretudo não ser uma pessoa condenada pela Justiça. Quanto à regulamentação, penso que as regras da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº. 135 de 2010) deveriam se estender ao ambiente digital.
O eleitorado deverá ser bastante crítico em relação a tudo que lê, seja em sites de notícias ou nas mídias sociais. Com mais pessoas em casa e o aumento do uso da internet em 2020, o arsenal de marketing eleitoral deverá ser utilizado intensamente no ambiente digital. Faz parte das táticas e estratégias do marketing a programação neurolinguística que usa gatilhos mentais para persuadir o eleitor a partir da criação de diversas narrativas. Por exemplo, que candidato A ou B é melhor por tais motivos.
Por outro lado, destaca-se o papel da imprensa e de grupos de fact-checking ao verificar a veracidade de notícias e imagens que surgem nas redes, para que o usuário e eleitor não seja induzido a falsos julgamentos. Entender a realidade nunca foi tão complexo, devido à pluralidade de discursos nas redes sociais, que promovem a interpretação de um fato conforme suas visões de mundo. Pessoas com visão política mais extremista, por exemplo, tendem a acreditar mais em determinadas versões políticas de um determinado fato. Procurar se despir de ideias pré-concebidas e se ater aos fatos antes de julgar pode ser de grande valia. Além disso, é importante sempre se lembrar que um fato pode ter muitas versões e nem sempre a mais correta estará de acordo com o que você acredita.
A renovação de mindset na classe política, que tanto o Brasil precisa, em grande parte ocorrerá por candidatos que forem capazes de alinhar pensamento, palavra e ações. Nesse contexto, aqueles que de fato querem reduzir desigualdades, diminuir os privilégios da classe política, combater a corrupção e melhorar a qualidade do gasto público podem dar um belo exemplo abrindo mão do fundo eleitoral, para que esse dinheiro (pouco mais de R$ 2 bilhões) seja empregado em políticas de habitação, educação e saúde. Conhecer o candidato, suas realizações e aspirações como cidadão, se utilizou valores do fundo eleitoral (e quanto), pode fornecer boas pistas se o candidato merece ou não um “voto de confiança” do eleitor. O exercício da Cidadania é a base da Democracia e se consubstancia através do voto, que, quando é feito com consciência, eleva a comunidade, as instituições políticas e o Estado Brasileiro.
*Dane Avanzi é empresário, advogado e Diretor do Grupo Avanzi.