ONU: países cobram governança de IA e fundo para fomentar tecnologia entre ricos e pobres

Com a discordância da Russia, que entende que a discussão não passou por todos os países e a ausência dos principais líderes mundiais que possuem as principais empresas desenvolvedoras da tecnologia, a “Cúpula do Futuro” aprovou neste domingo (22) um documento contendo uma série de propostas para o desenvolvimento da Inteligência Artificial em todo o mundo. Algumas delas são bastante ambiciosas como, por exemplo, a que visa estabelecer uma “governança internacional da IA em benefício da humanidade” e a criação de um fundo global para fomentar as ações necessárias à disseminação da tecnologia entre ricos e pobres.

São propostas que certamente acabarão interpretadas pelas big techs como mais uma tentativa de controle das suas atividades em todo o mundo. O documento estabelece cinco objetivos para a transformação digital dos países – sendo o quinto dedicado exclusivamente para o uso da IA – a serem perseguidos pelas nações na intenção de universalizar o acesso às novas tecnologias.

O evento antecedeu a 79ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em Nova York, cuja abertura nesta segunda-feira (23) será feita pelo presidente Lula. Ele inclusive discursou ao participar da “Cúpula do Futuro” e é possível que retome o assunto diante das lideranças mundiais que estarão presentes no evento.

Na área digital, os cinco objetivos centrais para o avanço da tecnologia e sua disseminação de forma igualitária pelos países membros da ONU, sejam ricos ou pobres, são as seguintes:

Objetivo 1. Acabar com todas as divisões digitais e acelerar o progresso em todos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável;
Objetivo 2. Expandir a inclusão e os benefícios da economia digital para todos;
Objetivo 3. Promover um espaço digital inclusivo, aberto, seguro e protegido que respeite, proteja e promova os direitos humanos;
Objetivo 4. Promover abordagens de governança de dados responsáveis, equitativas e interoperáveis e;
Objetivo 5. Melhorar a governança internacional da inteligência artificial para o benefício da humanidade

A palavra “risco” no uso da IA é citada três vezes no Objetivo 5 e os países querem a criação de um organismo internacional como o principal meio de controle e fomento das nações sobre o uso dessa tecnologia. “Precisamos urgentemente avaliar e abordar de forma inclusiva o impacto potencial, as oportunidades e os riscos dos sistemas de inteligência artificial no desenvolvimento sustentável e no bem-estar e direitos dos indivíduos”, destacou o documento.

Por conta dessa visão, foi aprovada a criação de um organismo que terá representação plena e igualitária de todos os países, especialmente os países em desenvolvimento, e a participação significativa de todas as partes interessadas. “A cooperação internacional é necessária para promover a coordenação e a
compatibilidade de estruturas emergentes de governança de inteligência artificial”, destacou o documento, acresentando ser a ONU o fórum adequado para “desempenhar na formação, habilitação e apoio a essa governança”.

Esse modelo permitirá que os países possam contar e desfrutar das decisões que forem tomadas a partir de um conjunto de ações a serem estabelecidas por essa estrutura de governança. São elas:

(a) Avaliar as futuras direções e implicações dos sistemas de inteligência artificial e promover o entendimento científico;
(b) Apoiar a interoperabilidade e a compatibilidade das abordagens de governança da inteligência artificial por meio do compartilhamento de melhores práticas e da promoção do entendimento comum;
(c) Ajudar a desenvolver capacidades, especialmente em países em desenvolvimento, para acessar, desenvolver, usar e governar sistemas de inteligência artificial e direcioná-los para a busca do desenvolvimento sustentável;
(d) Promover transparência, responsabilização e supervisão humana robusta de sistemas de inteligência artificial em conformidade com o direito internacional.

Com base nessa estratégia, a expectativa é que se crie um “Painel Científico Internacional Independente” multidisciplinar sobre IA, dentro da ONU, com representação geográfica equilibrada, que terá por objetivo avaliar os impactos, riscos e oportunidades “aproveitando iniciativas e redes de pesquisa nacionais, regionais e internacionais existentes”.

Estrutura

No documento, foi solicitado ao presidente da Assembleia Geral da ONU a nomeação nesta segunda-feira, durante a 79ª Sessão, dos representantes que farão o trabalho de criação desse Painel Científico Internacional Independente sobre a IA. Ele deverá ser composto por representantes de um país desenvolvido e de um em desenvolvimento. A Cúpula também cobrou da ONU que sejam informados detalhadamente sobre funções operacionais, estrutura, localização, renovação de mandato, recursos e pessoal.

“Para identificar, por meio de um processo intergovernamental e consultas com outras partes interessadas relevantes, os termos de referência e modalidades para o estabelecimento e funcionamento do Painel Científico Internacional Independente sobre IA e do Diálogo Global sobre Governança de IA para adoção pela Assembleia Geral”, explica o documento.

A ideia seria desenvolver e passar a adotar um “padrão de inteligência artificial interoperável”, que assegure para todos os países a segurança, a confiabilidade,m a sustentabilidade e os direitos humanos. “Que protejam e preservem a diversidade linguística e cultural e levem em consideração o multilinguismo ao longo do ciclo de vida desses sistemas”, através de parcerias internacionais que visem desenvolver sistemas abertos com o foco em programas de educação e treinamento, com a participação de micro, pequenas e médias empresas na economia digital.

Para tanto, na proposta ficou estabelecido que a Assembleia Geral nomeará “cofacilitadores”, formados por um país em desenvolvimento e o outro país desenvolvido, para durante a octogésima primeira sessão “facilitar as consultas intergovernamentais abertas, transparentes e inclusivas” e determinar as modalidades e temas para uma reunião de alto nível e a discussão do tema.

Fundo

A “Cúpula do Futuro” também pede o investimento, particularmente do setor privado e da filantropia, para ampliar a capacitação em inteligência artificial no desenvolvimento sustentável das nações.

O documento propõe que a Secretaria Geral, consulte “potenciais contribuintes” e a criação pelas Nações Unidas, “que desenvolva “opções inovadoras de financiamento voluntário para a capacitação em inteligência artificial que levem em consideração as recomendações do Órgão Consultivo de Alto Nível sobre Inteligência Artificial em um Fundo Global para IA”.

Foi sugerida que essa proposta seja apresentada na 79ª Sessão e se torne num mecanismo de financiamento relevante das Nações Unidas aos países que precisam de apoio financeiro para se desenvolverem na tecnologia.

(Foto Ricardo Stuckert/ PR)