Onde foi parar a patente do chip da Ceitec que pode detectar Covid-19?

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) divulgou ontem (16) o edital de chamamento público nº11, que visa identificar e contratar uma Organização Social interessada em assumir a gestão e explorar economicamente o legado de toda a propriedade intelectual da Ceitec SA, estatal do chip em processo de extinção pelo Governo Bolsonaro. O edital suscita algumas dúvidas, mas o ministério até agora não veio à publico explicá-las.

A principal delas foi levantada ontem nas redes sociais por funcionários e ex-trabalhadores da estatal: todas as patentes registradas pela Ceitec constam no Edital?

A depender das futuras explicações do MCTI, o que for dito até poderá levar o ministro Marcos Pontes para uma visitinha à CPI da Covid, no Congresso Nacional. Mas é fato que não consta no edital o registro dessa patente.

Quando o MCTI irá explicar a ausência desse documento aqui?

A CPI investiga justamente a omissão do governo federal no combate à pandemia do Coronavírus. Então Pontes precisaria explicar como tinha a patente de um chip capaz de detectar doenças, entre elas, a Covid-19 e não fez absolutamente nada com ele, do mesmo jeito que o governo deixou guardado no almoxarifado do Ministério da Saúde testes para detecção do vírus?

A CPI deveria ouvir o ministro sobre essa situação. Ainda mais sabendo que, desde o ano passado o astronauta – que nas horas vagas também é ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações – fez diversos eventos, alguns com a presença do presidente Bolsonaro, para divulgar “estudos” pagos pelo MCTI (que não se sabe quanto gastou), sobre os benefícios no uso de vermífugos para o combate à Covid-19. Estudos que não deram em nada e só renderam mídia eletrônica e impressa para o ministro, pois a eficácia do tratamento da doença se dá por meio de vacinas, que já se sabe que o governo demorou para comprar.

As duas pergunta que caberiam ao relator da CPI, Renan Calheiros, para Marcos Pontes deveriam ser: 1 – por que o MCTI lança um edital para contratação de uma Organização Social, que irá gerir patentes de uma estatal em extinção e omite publicamente, em documento oficial, a existência da patente de um dispositivo que, se fabricado pelo Brasil, poderia identificar precocemente a presença do vírus no corpo humano, não só aqui, mas no resto do mundo? 2 – Se produzido pela Ceitec em larga escala, quanto o Brasil poderia ter faturado com as vendas, considerando o dólar a cinco reais?

Pessoal/Orçamento

O Edital do MCTI prevê que “a entidade selecionada qualificada como Organização Social, deverá oferecer contrato de trabalho para, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) do pessoal da Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada – CEITEC-S/A do cargo efetivo de nível superior de “Especialista em Tecnologia Eletrônica Avançada – ETEA”, que atuavam na Superintendência de Produto, Pesquisa e Desenvolvimento”.

Em 2020 o quadro de pessoal da Ceitec era de 160 funcionários. De lá para cá a estatal, ao entrar na reta final de sua extinção, tentou demitir 33 trabalhadores, mas sem sucesso no judiciário trabalhista do Rio Grande do Sul. Mesmo assim, alguns funcionários, em sentido inverso, já estão buscando na Justiça o direito de se desligar previamente da empresa antes que venha a demissão. E segundo informações obtidas por esse site, justamente são os mais qualificados, aqueles que facilmente serão absorvidos pelo mercado de microeletrônica.

Então, o Edital já começa com a suspeita de que poderá ocorrer problemas para a “OS” absorver mão de obra “estratégica” da Ceitec. Pois não é certo que terá à disposição para contratar os 48 funcionários da área escolhida para ser preservada. Muitos já podem ter se mandado para o mercado de trabalho, que é enxuto e precisa de gente qualificada, depois que o governo abandonou a ideia de ter uma estatal e não depender da tecnologia alheia.

Outra coisa chama a atenção no Edital: o orçamento da nova Organização Social de R$ 20 milhões é praticamente o mesmo da “perdulária Ceitec”, considerando o que pensa sobre ela o Ministério da Economia. O Congresso Nacional aprovou para o ano de 2021 um orçamento de R$ 27,7 milhões. O MCTI, pelo visto, fez uma porca economia de R$ 7 milhões.

Ao todo a “OS” terá um orçamento de R$ 80 milhões, considerando esse orçamento anual de R$ 20 milhões, que será desembolsado pelo MCTI pelos próximos próximos quatro anos. Só precisará dar lucro após esse período, para se manter de pé.

A conta não fecha direito.

Se a intenção era extinguir uma “estatal cara”, por que o MCTI irá manter o mesmo nível de gasto anual com uma Organização Social que não irá fabricar nada, terá somente 48 funcionários para desenvolver novos projetos e não utilizará a sala limpa da estatal?

Sala Limpa

Aliás, o Edital informa que, “não é necessário que a Organização Social qualificada tenha sua própria “sala limpa”, conforme prescrito na ISO 14644-1:2015. Contudo é fundamental que tenha ao menos uma parceria para uso com alguma entidade, que possua a referida infraestrutura, compatível com a proposta apresentada”.

Como assim?

A sala limpa da Ceitec não será usada pela Organização Social? E o que pretendem fazer com ela? Quer dizer que a “OS” não precisará ter uma, mas poderá fechar “parcerias” com outras entidades? Quem irá pagar essa conta por fora, o MCTI? Ainda que fosse usar, como faria, já que poderá demitir todos os funcionários especializados nessa área?

Candidatas

Já circula pelos corredores de Brasília os nomes de algumas candidatas ao posto de “Organização Social” que irá controlar o legado tecnológico da Ceitec: Softex, Senai, Cimatec, Instituto Eldorado.

A Softex tem sido considerada “a candidata mais provável” de ser escolhida pelo MCTI para atuar como a herdeira da estatal do chip. Por ser uma Organização Social Civil de Interesse Público (OSCIP), vinculada ao ministério e atuar na promoção do mercado brasileiro de software há 24 anos.

Porém, essa vinculação não fere os artigos 6º, 7º e 8º da portaria que criou a “Comissão de Seleção” (Portaria nº 4.879/21) e tratam do conflito de interesses dos membros dela?

Essa questão vai muito além do problema de terem funcionários de escalões inferiores do MCTI, na Comissão de Seleção da Organização Social que será substituta da Ceitec. O debate que poderá entrar na pauta de discussões, até jurídicas, diz respeito à lisura do processo de escolha dessa “OS”.

Afinal de contas, a Softex teria capacitação técnica, de fato, para assumir essa transição do modelo estatal para o publico/privado, sendo uma entidade umbilicalmente vinculada à Secretaria de Empreendedorismo e Inovação – SEMPI do MCTI, ao ponto do titular, Paulo César Rezende De Carvalho Alvim, ser membro do Conselho de Administração dela?

*Vejam o edital de seleção da Organização Social que irá substituir a Ceitec.