O jogo de empurra que pode atrasar a regulamentação da IA até 2027

Se for cumprida toda a agenda criada pelo relator deputado Agnaldo Ribeiro (PP-PB) na Comissão Especial da Câmara que analisará o PL 2.338/23 do Senado, que regulamenta a Inteligência Artificial, o Brasil corre o risco de somente aprovar uma regra para o uso da tecnologia em 2027. Agnaldo apresentou ontem (27) o seu cronograma de trabalho na comissão e voltou a admitir que mexerá no texto já aprovado pelo Senado, embora ressalte que conversará com os senadores no sentido de obter o aval deles para as alterações que fará. Pelos cálculos do deputado, seu parecer somente estará pronto em 25 de novembro e a partir daí a comissão terá o prazo para debater o texto e votá-lo. Isso significa que a matéria poderá retornar ao Senado em janeiro de 2026, em meio ao recesso parlamentar e num ano eleitoral.

O desperdício de tempo na Comissão da IA é evidente. Pois aparentemente pretende “zerar” todo o trabalho feito pelo Senado, ao decidir retomar a série de audiências públicas para a discussão de tudo o que já foi amplamente debatido pelos senadores. E não são poucas as audiências; somente os pedidos feitos pelos deputados (as) totalizaram 18 requerimentos, para ouvir uma série de entidades empresariais, lobistas, governo, juristas, empresas, acadêmicos e especialistas da área, além de ONGs. A maioria esmagadora já esteve apresentando o seu pensamento sobre a regulamentação da Inteligência Artificial nas audiências que ocorreram no Senado.

Há ainda a vontade do deputado e relator, Agnaldo Ribeiro, de também realizar as suas audiências públicas e outros cinco seminários regionais, sendo que a prevista para o Nordeste provavelmente ocorrerá na Paraíba, onde o parlamentar deseja aparecer. Não satisfeito, Agnaldo ainda propõe a realização de um seminário internacional, no qual ele deseja chamar diversas entidades internacionais (ONU e OCDE, por exemplo), além de autoridades norte-americanas, da China e da União Européia.

O deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) se mostrou preocupado com a possibilidade dessa agenda acabar inviabiizando a definição da regulamentação da Inteligência Artificial no Congresso Nacional ainda este ano, levando o assunto para 2026.

“Esse tema é importantíssimo, uma janela que está acontecendo no mundo e o Brasil pode ser protagonista nesse movimento. A reflexão que eu trago aqui é de que temos de ouvir a sociedade, temos que fazer essas audiências, sim. Porém, o calendário apresentado, para ser concluído em 25 de novembro. quando já estamos tratando de Orçamento e já é final de ano eu acho pouco provável que a gente consiga cumprir. E se não conseguirmos votá-lo – que ainda tem plenário – vai ficar para o ano que vem, que é ano de eleição. Vai ficar para depois da eleição e é uma janela imensa que nós vamos perder”, frisou o parlamentar mineiro, sugerindo que pelo menos duas audiências ocorram ao longo de cada semana para tentar encurtar esse prazo.

Só que o calendário político não está batendo com o da comissão. Por exemplo, na semana que vem haverá o 11º Fórum Parlamentar do Brics, e o Congresso irá parar para se dedicar aos debates desse evento, que ocorrerá entre os dias 3 e 5 de junho em Brasília. Após essa reunião de caráter internacional, o foco político se volta para o Nordeste, onde começa a temporada das festas juninas. Todos os parlamentares da região não têm como deixar de comparecer a essas comemorações nas suas bases. Isso dificultará ainda mais a realização das audiências públicas que o relator e diversos parlamentares querem imprimir na Comissão da Inteligência Artificial. Junho e julho são meses praticamente perdidos no Congresso Nacional.

Essas reuniões poderiam ser enxugadas, sim, se não houvesse o interesse velado de muitos deputados de postergar a regulamentação da IA no país. Muitas das audiências propostas serão meras repetições daquilo que já foi debatido no Senado.

Esses atrasos acabam saindo aquilo que as emprersas e principalmente as big techs desejam. É nítido que elas querem atrasar ao máximo com discussões inúteis sobre regulamentação da Inteligência Artificial. Da mesma forma como ocorreu com PL 2630/20 (das Fake News), que virou uma proposta de regulação das plataformas de redes sociais que terminou engavetada pelo então presidente da Câmara, Arthur Lira.