MCTI gasta R$ 33 milhões para capacitar trabalhador de empresas privadas, enquanto deixa Ceitec sem solução

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações continua “parceirão” da ABISEMI, a Associação que reúne todas as empresas do mercado de semicondutores e a mesma que contribuiu fortemente para o Governo Bolsonaro defender a extinção da estatal Ceitec – única fábrica do segmento na América Latina. O ministério, numa prova clara de aquilo que o presidente Lula diz não se escreve, decidiu anunciar um novo programa para “promover a formação de recursos humanos na área de microeletrônica; capacitar 200 gestores e empreendedores, aumentar a densidade empreendedora nesse segmento e fortalecer o ecossistema nacional de microeletrônica”. Do mercado privado, é claro.

Com o pomposo nome de “CI Inovador”, o novo programa despejará pelo governo federal R$ 33 milhões para capacitação de trabalhadores de empresas privadas. Faltam profissionais qualificados para design e backend no mercado e, sendo assim, o “Estado” foi chamado a quebrar esse galho financeiro das empresas com formação de pessoal.

Até o Governo Bolsonaro essas mesmas empresas defendiam o discurso liberal do “menos Estado na economia”, conforme bradava aos quatro ventos o ex-ministro da Economia, Paulo Guedes. O dinheiro aportado pelo governo será triangulado com a Softex, outra que trabalhou ativamente para ficar com o legado da extinção da estatal, na parte do conhecimento científico e tecnológico (patentes, etc) e alguns Institutos de Pesquisa que farejam dinheiro para formar e capacitar mão de obra para a indústria local.

Enquanto o MCTI faz cortesia para o setor privado, depois de sete meses de Governo Lula o país continua sem uma resposta clara sobre o destino da Ceitec. Até agora sabe-se muito pouco sobre a reativação da única fábrica de semicondutores da América Latina.

A informação mais recente foi a demissão do militar nomeado por Bolsonaro e Paulo Guedes para ser o liquidante da Ceitec e a nomeação de alguns quadros – nem todos os demitidos foram chamados de volta à empresa – para suprir a necessidade de gestão de uma estatal recém reativada. Mas que até agora não se sabe quais as circunstâncias ela voltará ao mercado de microeletrônica. Entre esses quadros estão o ex-secretário de Política de Informática em governos anteriores do PT, Augusto Gadelha, e o ex-secretário de Telecomunicações (Ministério das Comunicações) e de Inovação (Indústria e do Comércio) também nos governos anteriores do PT, Nelson Fujimoto. Emprego essa turma já tem, resta saber para quê.

“Esse programa chega em um momento em que o mundo enfrenta um apagão gigante no segmento de semicondutores e necessita de técnicos nas áreas de design e de produção. O CI Inovador se diferencia por capacitar não apenas pessoas com perfil técnico, mas também empreendedores que colaborarão para alavancar a densidade de empresas especializadas, fortalecendo assim o ecossistema nacional de microeletrônica”, avalia Diônes Lima, vice-presidente executivo da Softex.

Chega a ser curioso e criminoso esse discurso. Pois essa preocupação de agora com a “capacitação” não é a mesma da Softex no Governo Bolsonaro. Lá atrás o único interesse dessa organização social era a de por as mãos nas patentes da Ceitec para negociá-las no mercado em nome do governo.

Essa “capacitação” não visa a reativação de uma estatal. Tem apenas o interesse de financiar empresas – representantes de multinacionais – que não querem tirar dinheiro do seu bolso para a formação de seu pessoal. Ora, se tem recursos sobrando no MCTI, por que não pegar uma caroninha neles? Quando se trata de não gastar, de ter acesso a recursos públicos o setor privado adora ter o Estado como “parceiro”. É o famoso “capitalismo sem risco”.

Agora por dinheiro na Ceitec, que lá atrás perdeu todos os seus profissionais para a iniciativa privada durante o famigerado processo de extinção, o governo não faz. Embroma em dar uma resposta sobre o que irá fazer com a Ceitec, simplesmente porque os mesmos personagens que defendiam a sua extinção continuam operando na surdina dentro do MCTI. Entre eles, os empresários da ABISEMI.

Tanto é assim que o MCTI já anuncia a destinação de recursos públicos para formação de pessoal no setor privado. A Ceitec? Que se exploda, passou quatro anos na zona cinzenta da extinção, que passe mais quatro na da reativação. Até que alguém convença Lula que a ideia não tem mais sentido, que ele precisa reorganizar o seu discurso político.

O edital do “CI Inovador” está no link abaixo, da página já criada pela Softex para tocar o programa regado com dinheiro do governo: https://ciinovador.softex.br/