
Entrevista com Carlos Jacobino, presidente do Sinfor-DF, sobre o ano que termina e qual a expectativa do sindicato das empresas do setor de Tecnologia da Informação no Distrito Federal para o ano de 2026.
Segue a entrevista:
Como o senhor define 2025 para o setor de Tecnologia da Informação no Brasil e no Distrito Federal?
Carlos Jacobino – A TI passou a aparecer como infraestrutura crítica nos instrumentos formais do Estado. Em 2025, tecnologia deixou de ser tratada apenas como “apoio à modernização” e passou a ser explicitamente enquadrada como condição de funcionamento de políticas públicas centrais. Isso é visível na forma como governo federal, estados e grandes municípios passaram a estruturar agendas de transformação digital vinculadas a eficiência fiscal, controle, prestação de serviços essenciais e capacidade regulatória. A TI passou a ser tratada de modo semelhante a energia, logística e telecomunicações: algo que, se falha, compromete o sistema inteiro. No Distrito Federal, esse movimento foi acompanhado por maior maturidade do ecossistema local, com ampliação do número de empresas de base tecnológica, crescimento da demanda pública por soluções digitais e maior integração entre setor produtivo, governo e instituições de ensino.
Quais transformações mais marcaram esse período?
Carlos Jacobino – A incorporação da Inteligência Artificial aos produtos, serviços e processos foi o principal vetor de transformação. Relatórios globais e nacionais mostram que a IA passou a integrar a arquitetura básica das soluções tecnológicas, influenciando investimentos em infraestrutura, modelos de negócio e exigências de governança, segurança da informação e conformidade regulatória. Em 2025, a IA deixou de ser experimental para se tornar componente estrutural das decisões tecnológicas.
Além da IA, que outros movimentos estruturais merecem destaque?
Carlos Jacobino – O avanço do debate regulatório foi significativo. A aplicação da LGPD entrou em fase mais madura, com maior fiscalização e exigência de conformidade, enquanto as discussões sobre marcos regulatórios para IA ganharam densidade técnica e institucional. Paralelamente, a reforma tributária introduziu novas camadas de complexidade para empresas de software, SaaS e serviços digitais, especialmente no que se refere à tributação sobre consumo e serviços. Também se observou maior concentração de mercado, fenômeno registrado em levantamentos setoriais, com grandes players ampliando participação, o que reforça a necessidade de organização e representação do setor.
Do ponto de vista institucional, o que 2025 ensinou às entidades representativas?
Carlos Jacobino – Ficou evidente que a representação setorial exige capacidade permanente de leitura estratégica. O ambiente regulatório, tecnológico e econômico tornou-se mais interdependente e veloz. Representar o setor hoje implica articular agendas com o poder público, produzir consensos mínimos entre empresas de perfis distintos e oferecer subsídios técnicos qualificados para a formulação de políticas públicas. Esse aprendizado orientou a atuação do Sinfor-DF ao longo de 2025.
O Sinfor-DF tem se posicionado como articulador político-institucional e organizador do mercado local de TI. O que isso significa na prática?
Carlos Jacobino – Significa atuar como espaço de convergência entre empresas, governo, academia e demais atores do ecossistema. Em um setor caracterizado por alta fragmentação e rápida evolução tecnológica, organizar o mercado envolve criar ambientes de governança, diálogo contínuo e planejamento de médio e longo prazo, reduzindo assimetria de informação e qualificando o processo decisório.
Como as diferentes frentes de atuação do Sinfor-DF se conectam?
Carlos Jacobino – Planejamento setorial, articulação institucional, participação em fóruns estratégicos e defesa de governança em rede integram uma mesma lógica. Essas frentes se complementam na construção de um ecossistema mais previsível, inovador e competitivo, capaz de sustentar crescimento econômico e geração de empregos qualificados no Distrito Federal.
Projetos como o avanço do Distrito de Tecnologia em Brasília sinalizam uma mudança de patamar. Qual é o significado estratégico dessa iniciativa?
Carlos Jacobino – O Distrito de Tecnologia reflete uma compreensão já observada em experiências nacionais e internacionais: desenvolvimento econômico baseado em tecnologia exige planejamento territorial, governança clara e visão de longo prazo. Não se trata apenas de atrair empresas, mas de estruturar um ambiente integrado que favoreça inovação, formação de talentos e impacto econômico consistente para o DF.
A proposta de criação de um Conselho de Transformação Digital e de uma empresa pública de TI também faz parte dessa visão?
Carlos Jacobino – Sim. Essas propostas dialogam com evidências de que a fragmentação da transformação digital no setor público gera sobreposição de esforços, aumento de custos e perda de eficiência. Instâncias de coordenação estratégica permitem alinhar prioridades, profissionalizar contratações e melhorar a governança das soluções tecnológicas adotadas pelo Estado.
A reforma tributária foi um tema central em 2025. Como ela impacta o setor de TI?
Carlos Jacobino – A reforma introduz impactos relevantes para empresas de software, SaaS e serviços digitais, com potencial aumento da carga tributária efetiva, conforme análises preliminares de entidades empresariais e especialistas tributários. Esse movimento ocorre em um momento em que a tecnologia é reconhecida como fator crítico de produtividade e competitividade, o que exige atenção para evitar efeitos adversos sobre inovação e crescimento do setor.
Como equilibrar arrecadação, competitividade e desenvolvimento tecnológico?
Carlos Jacobino – Esse equilíbrio depende de diálogo qualificado, análises técnicas consistentes e compreensão do papel estratégico da TI para o desenvolvimento econômico. O setor busca previsibilidade e coerência regulatória, alinhando o discurso de inovação às escolhas concretas de política pública.
Compras públicas seguem sendo um vetor importante para o setor no DF. O que precisa evoluir?
Carlos Jacobino – O principal avanço necessário é compreender compras públicas de tecnologia como instrumento de organização do mercado e de fortalecimento da capacidade estatal. O Estado precisa contratar soluções tecnológicas considerando arquitetura, interoperabilidade, segurança, continuidade e governança ao longo do tempo. Isso implica superar modelos excessivamente orientados a preço e adotar critérios que valorizem qualidade técnica, gestão de risco, capacidade de evolução das soluções e responsabilidade sobre dados e serviços críticos. Compras públicas bem desenhadas induzem padrões mais elevados no mercado, estimulam inovação aplicada, fortalecem empresas com maturidade institucional e resultam em serviços mais confiáveis e eficientes para a sociedade.
Como o avanço da regulação e da governança de dados mudou a atuação das empresas de TI?
Carlos Jacobino – Governança de dados, compliance e segurança passaram a ocupar posição central na estratégia das empresas. Esses elementos influenciam decisões técnicas, contratuais e organizacionais, refletindo um ambiente de maior responsabilização e exigência regulatória.
Tendências como IA agêntica e plataformas nativas de IA ampliam esses desafios?
Carlos Jacobino – Sim. Modelos mais autônomos e distribuídos exigem estruturas robustas de governança, auditoria, explicabilidade e segurança, reforçando a necessidade de integração entre áreas técnicas, jurídicas e de compliance.
A discussão sobre soberania de dados e infraestrutura local ganhou força. Como o Brasil pode se posicionar?
Carlos Jacobino – O posicionamento passa por combinar inserção global com fortalecimento de capacidades locais, respeitando requisitos de soberania, regulação e eficiência econômica. O Distrito Federal reúne condições institucionais e estratégicas para participar ativamente desse debate.
A escassez de profissionais qualificados continua sendo um gargalo. Por quê?
Carlos Jacobino – A escassez de profissionais qualificados persiste porque a velocidade da transformação tecnológica supera a capacidade de formação, atualização e retenção de talentos. O setor de TI passou a demandar perfis mais complexos, que combinam domínio técnico, compreensão de negócio, noções de regulação, segurança da informação e governança de dados, competências que exigem aprendizado contínuo e ambientes de maturação profissional. Há ainda um descompasso estrutural entre currículos tradicionais e as necessidades reais do mercado, especialmente em áreas como inteligência artificial, dados, cibersegurança e computação em nuvem, somado à competição global por talentos, que pressiona salários, eleva a rotatividade e dificulta a retenção, sobretudo em ecossistemas locais.
O que muda em 2026 para o setor de TI?
Carlos Jacobino – O setor de TI passa a operar sob um nível mais elevado de cobrança por valor, impacto e responsabilidade. A tecnologia deixa de ser avaliada apenas pela sua capacidade de inovar ou modernizar processos e passa a ser medida pela contribuição direta para resultados estratégicos, eficiência operacional, segurança institucional e sustentabilidade econômica. Organizações públicas e privadas tendem a exigir maior clareza sobre retorno sobre investimento, continuidade dos serviços, governança de dados e mitigação de riscos, em um ambiente marcado por regulação mais presente, uso intensivo de inteligência artificial e maior sensibilidade social sobre decisões automatizadas. Esse cenário desloca o foco do setor para entregas mais consistentes, integração entre áreas técnicas e decisórias e fortalecimento da confiança como ativo central da atuação tecnológica.
Qual será o papel do Sinfor-DF nesse cenário?
Carlos Jacobino – Atuar como radar estratégico, articulador institucional e organizador do ecossistema, antecipando debates, qualificando agendas e contribuindo para que o setor de TI do Distrito Federal permaneça fortalecido, competitivo e alinhado aos desafios nacionais.







