Anatel joga para o “interesse da sociedade”, exclui Huawei na rede 5G e corre risco de um leilão deserto

A Agência Nacional de Telecomunicações realizou hoje uma sessão extraordinária para tentar aprovar o edital de leilão das frequências do 5G, a quinta geração da telefonia móvel. E, sem tocar diretamente em nomes de fabricantes de infraestruturas de rede, deixou claro que não aceita o argumento das empresas de telefonia, de aproveitar o legado Huawei na infraestrutura montada para o 4G, agora na futura rede 5G.

Em outras palavras a chinesa Huawei, presente na maioria das redes das operadoras móveis no 4G, não será aproveitada na quinta geração. O impacto de tal decisão não foi levado em conta pela maioria do conselho diretor do órgão regulador, por entender que a argumentação não atende aos “interesses da sociedade”.

Gambiarra

O relator do edital do leilão do 5G, Carlos Baigorri foi claro em sua apresentação. Segundo ele, a sociedade brasileira foi convencida de que a implantação da Tecnologia 5G no Brasil será uma “revolução tecnológica”, tal como ocorre no mundo.

Todos os benefícios previstos na nova rede, segundo ele, estarão ao alcance dos brasileiros. Neste caso, não teria cabimento a Anatel aprovar o pedido das empresas de telefonia de ao fazerem um upgrade nas redes 4G para evoluírem e interoperarem com as redes 5G, que elas possam reaproveitar a tecnologia Huawei na maior parte das redes.

Baigorri foi taxativo, isso não seria implantar o 5G no Brasil com todas as possibilidades de aplicações que a nova tecnologia proporciona. Em sua visão, seria “uma versão 4G melhorada”, que não condiz com o verdadeiro potencial do 5G.

Os argumentos de Baigorri são válidos, mas há alguns questionamentos a serem levados em conta. Uma coisa é você montar uma rede 5G com tudo o que a tecnologia possibilita em toda a Europa, outra é implantar num país do tamanho do Brasil, onde toda a Europa cabe confortavelmente.

Obviamente os grandes centros teriam a plena capacidade do 5G, as teles não seriam tão burras. Mas assumir hoje os compromissos de abrangência que a Anatel exige em edital, levando um 5G pleno a qualquer canto do país seria uma ideia inviável, um tiro no pé para as empresas.

Primeiro, porque não há dinheiro disponível na praça para as empresas bancarem um projeto dessa magnitude em todo o Brasil, ainda mais com uma pandemia em curso e um dólar a R$ 5. Não seria lógico, inclusive, manterem os custos operacionais de uma rede 4G em funcionamento e ainda terem de implantar uma nova rede 5G.

O que o governo propõe agora tende a fazer com que as empresas não participem do leilão. Mesmo que não termine deserto, nem todas as empresas podem se motivar a assumir compromissos que não cumprirão, o que as levará no futuro a assinarem “ajustamentos de conduta” para repetirem metas que não cumpririam agora. Enfim, quem está certo ou errado?

Racha

Houve um pedido de vistas do presidente da Anatel, Leonardo Euler de Moraes, mas três dos cinco conselheiros já deixaram claro que seguirão a proposta apresentada hoje. Os conselheiros Moisés Queiroz Moreira e Vicente Bandeira de Aquino Neto já anteciparam seus votos e fecharam com a proposta de edital do conselheiro Carlos Manuel Baigorri.

Há ainda o voto do conselheiro  Emmanoel Campelo de Souza Pereira, mas não fará diferença no resultado da votação. No máximo, se ele se decidir pelo texto do relator Baigorri, deixará o presidente da Anatel isolado.

*Se tal ocorrer, só me lembro de um isolamento tão significativo assim no início da Anatel, quando então o primeiro presidente, Renato Guerreiro, terminou sozinho na escolha da tecnologia CDMA, quando o resto do conselho optou pelo GSM na criação da rede 3G.