Em quase 15 anos cobrindo o setor de TICs e, em especial, as estatais de Tecnologia da Informação, nunca tinha visto um presidente de empresa pública dedicar a sua agenda de compromissos para encontros com representantes de bancos privados, todos num mesmo dia.
Nesta sexta-feira pela manhã, enquanto vocês estiverem lendo essa informação, saibam que o presidente do Serpro, Caio Mario Paes de Andrade, estará reunindo-se, primeiro, com a diretoria da Febraban – Federação Brasileira de Bancos.
Em seguida, Caio “receberá” a direção do “Grupo Pan”, leia-se Banco Pan, o ex Banco Panamericano, fundado por Silvio Santos, que virou moderninho, tipo “4.0”. Inclusive o presidente do banco, Luiz Monteiro, estará presente na reunião, não sei se de bermuda e camiseta. Detalhe, Caio terá a reunião na sede da Febraban e do banco, fato curioso, pois além da entidade, quem solicitou o encontro foi Luiz Monteiro. Mas é o presidente do Serpro quem se dará ao trabalho de ir até São Paulo para as reuniões.
Aí você me pergunta: mas o que será que os bancos estarão fazendo com o Serpro? Eu te respondo: O próprio Serpro diz que será para fazer “prospecção de negócios”.
What?
Isso mesmo, veja no print da imagem da agenda o teor dos encontros. E isso ocorre no dia seguinte ao Congresso Nacional aprovar o projeto de Lei de Conversão 7/2019, oriundo da MP 869/2018, que criou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados.
Como não me ocorre que os bancos estejam assim tão necessitados de serviços de Tecnologia da Informação desenvolvidos pelo Serpro, só posso deduzir que os bancos tenham visto interesse na empresa estatal apenas naquilo que ela guarda em seus computadores de grande porte: as minhas, as tuas, enfim, as informações de todos os brasileiros colhidas pelos diversos organismos de governo. A começar pela Receita Federal.
E isso é preocupante. Os efeitos daquilo que foi aprovado pelo Congresso Nacional em relação à Autoridade de Proteção de Dados, além das regras para proteção das informações dos cidadãos brasileiros, somente ocorrerá no segundo semestre de 2020.
Depois, é preciso relembrar que após o escândalo do consignado, que envolveu a empresa Consist e o extinto Ministério do Planejamento, na gestão do ex-ministro petista Paulo Bernardo, o Serpro passou a processar a gestão da margem consignada nas bases de dados dos servidores federais e pensionistas que tomam crédito junto ao mercado financeiro.
Como sempre, o Serpro fica devendo satisfações públicas para o seu comportamento enquanto empresa estatal e suas reuniões de portas fechadas com o mercado privado de tecnologia, que agora já avança para os bancos. Sem contar as inúmeras reuniões internas, e de cúpula da área econômica do governo, para tratar de negócios que, em instância final, podem envolver acesso a bancos de dados de servidores públicos e dos cidadãos brasileiros, disfarçados no tema “transformação digital”.
É sempre bom lembrar que desde a gestão Glória Guimarães o Serpro tem uma parceria com o Google, supostamente para um projeto de desenvolvimento de aplicativos de serviços públicos em meios digitais denominado “Team Works”. Digo supostamente porque ninguém sabe exatamente o que a multinacional ganha com esse acordo, nem tampouco a empresa estatal diz se remunera e como faz para isso.
O Serpro trata tal acordo com o rigor máximo de sigilo, ao ponto dele nem existir nas bases de dados sobre contratações que a estatal faz junto ao mercado privado. Informação que deveria constar a titulo de “transparência pública”, na sua pagina na Internet.
*Foto: IstoÉ Dinheiro.