Semicondutores: Abinee fala em aproveitar a Ceitec e Abisemi joga contra a estatal

A indústria nacional esteve hoje (04) debatendo a crise dos semicondutores no Brasil, em audiência pública realizada pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados. O resultado do encontro foi conseguir o apoio da comissão para o restabelecimento urgente dos incentivos fiscais do setor de semicondutores.

Em três meses está previsto o fim do PADIS – Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Indústria de Semicondutores, o que irá provocar uma retração na indústria local, num momento em que a falta de componentes eletrônicos vem atrasando a produção brasileira e mundial.

Mas a discussão da presença do Estado na Economia também colocou na mesa a questão da extinção da Ceitec, do ponto de vista de o país precisar reavaliar sua política para o setor, de forma a não continuar tão dependente da indústria asiática no futuro como vem ocorrendo agora.

Boa parte dos representantes da indústria não deram bola para a questão e preferiram focar nos seus problemas mais urgentes como a prorrogação do PADIS.

O fim da estatal, assunto que não estava previsto na pauta da audiência pública, acabou entrando nas discussões por pedido de diversos parlamentares, entre eles, o deputado Alceu Moreira (MDB-RS). Vem crescendo no Congresso a tese de que o governo vem dando um tiro no pé ao extinguir uma estatal que produz componentes eletrônicos justamente num momento de escassez mundial.

Durante as discussões, o deputado Alceu Moreira (MDB-RS) deu uma cobrada nos representantes da indústria pelo fato de quererem apoio do Estado para continuar recebendo incentivos fiscais, mas de serem oposição quando esse mesmo Estado quer desenvolver políticas que podem ajudar o setor industrial brasileiro a se tornar menos dependente da oferta de tecnologia estrangeira.

E isso acabou colocando duas das maiores entidades da indústria eletrônica em posições antagônicas: a Abinee – Associação da Indústria Elétrica e Eletrônica e a Abisemi – Associação da Indústria de Semicondutores.

O presidente da Abinee Humberto Barbato, apoiou a proposta do deputado gaúcho, de colocar à mesa para discussão com o governo um modelo de negócio que possa inserir a Ceitec – única fábrica de semicondutores da América Latina – como parte da solução nacional dos problemas da falta de componentes eletrônicos provocada agora pela pandemia do Covid-19. E numa estratégia de médio e longo prazos a estatal ajudar a indústria privada nacional a substituir em parte a dependência tecnológica asiática.

Essa posição não foi acompanhada pelo presidente da Abisemi, Rogério Nunes, que embora represente a indústria de semicondutores, nos bastidores tem jogado contra a permanência da estatal no mercado. Nunes, inclusive esteve no Ministério da Economia, conversando com técnicos do PPI – que executam a extinção da Ceitec – justamente para colocar uma pá de cal na estatal.

Rapinagem

Na Audiência pública desta segunda-feira na CCTCI da Câmara, o discurso de Rogério Nunes, que já era à favor da extinção da Ceitec, tem claros indícios de há uma articulação bem montada entre empresários e o Ministério da Economia, para que seja feito “esquartejamento” da estatal pelo governo após a sua extinção.

Ao falar da necessidade de o governo apoiar a indústria de semicondutores, Rogério Nunes sugeriu que a criação de uma fábrica no Brasil (curiosamente o país já tem uma) dependeria de um planejamento estratégico para viabilizá-la nos próximos anos. De ações claras da parte do governo para viabilização dela no mercado.

Nunes foi o mesmo empresário que na reunião do PPI disse que não via viabilidade econômica para a Ceitec, mas que se o governo criasse demanda para os produtos fabricados por essa fábrica, numa eventual privatização ela poderia se tornar viável no mercado brasileiro privado.

Hoje ele deixou claro isso, após falar dos “riscos” de uma fábrica no Brasil, depois que a Abinee se posicionou por uma rediscussão do papel da estatal Ceitec no contexto da indústria nacional de semicondutores. Para Rogério Nunes o governo não deve investir numa estatal, mas deve favorecer quem comprá-la.

Essa sinalização de esquartejamento da Ceitec para favorecer empresas privadas ficou ainda mais evidente pelas declarações do liquidante da Ceitec, o oficial da reserva da Marinha, Abílio Eustáquio de Andrade Neto. Numa explicação confusa sobre o seu papel no processo de extinção da estatal, que ele alega não estar extinguindo, Abilio reclamou o fato do Tribunal de Contas da União ter paralisado o processo, que o impede preparar a Ceitec para ser vendida, seja a fábrica como um todo, ou a venda de parte dos seus equipamentos.