Por Agustín Huerta* – É possível que a Inteligência-Artificial (IA) possa redigir e revisar contratos em questão de segundos, substituindo o trabalho que os advogados fazem atualmente? A mídia pode se apoiar inteiramente em ferramentas como o Chat GPT para escrever artigos do jornal? E será possível que, num futuro próximo, os resultados de uma ecografia sejam validados por uma aplicação especializada em diagnósticos médicos? Bom, embora pareça incomum à primeira vista, estas práticas estão se tornando cada vezes mais corriqueiras. E cabe a nós refletir.
A crescente capacidade das “máquinas” nos faz pensar ou pior, acreditar, que os algoritmos matemáticos tomarão decisões mais precisas e eficientes do que os humanos, tornando obsoletos os diversos trabalhos essenciais nos dias de hoje. Vale reparar no desaparecimento dos carteiros que batiam à porta das casas com correspondências de amigos e familiares, ou do funcionário que recomendava filmes nas locadoras, ou do jornaleiro na banca de revista, que distribuía centenas de exemplares com as notícias mais quentes do dia. Esses são exemplos claros de como mudamos a forma como consumimos produtos e serviços.
O fato é que a IA terá uma influência direta na forma como trabalhamos, gostemos ou não. Os pensadores mais apocalípticos propõem cenários de alta performance nas próximas décadas, enquanto outros pedem uma reconversão do mercado e o surgimento de novas demandas que antes não existiam, como o desenvolvimento de software, do marketing digital, da análise de dados e do surgimento dos drones.
Diante a isso, é possível refletir que a Inteligência Artificial terá impacto em tarefas específicas e não tanto em trabalhos internos. Por exemplo, o ChatGPT pode funcionar como um assistente de repórteres na redação de conteúdo, no entanto, os textos ainda necessitam da supervisão humana para gerar uma melhor entrega. Com o apoio da ferramenta, é provável que o jornalista aumente a produção quantitativa e qualitativa desses textos, mas seu papel continuará sendo necessário, como “maestro da orquestra”.
Além disso, cada trabalho desenvolvido por esta tecnologia tem aspectos contextuais que não podem ser omitidos. Uma empresa multinacional, por exemplo, não pode deixar que uma máquina decida sobre as estratégias jurídicas da organização. Contratos deste porte, todavia, são importantes e, ao mesmo tempo, complexos para serem confiados inteiramente a uma ferramenta que possui alta margem de erro e que não pode assumir responsabilidade legal pelo trabalho que executa.
Contudo, a Inteligência Artificial expulsará burocratas, intermediários desnecessários e funcionários que não agregam valor às empresas. Ter que aproveitar a tecnologia para ser mais produtivo e eficiente terá uma grande vantagem sobre tarefas que podem ser facilmente automatizadas, perdendo, assim, a oportunidade de se destacar em um mercado de negócios cada vez mais competitivo. Sendo assim, é muito mais lucrativo focar no que a IA pode fazer para melhorar nos trabalhos, ao invés de se preocupar em como ela pode prejudicar. Nesta linha, os negócios serão valorizados como nunca.
Por outro lado, a Inteligência Artificial eliminará o que se chama de desk work, ou seja, tarefas mecânicas e repetitivas que não exigem um alto nível intelectual para serem executadas. No entanto, essas tarefas também ocupam parte do nosso tempo e podem servir como uma pausa mental. Nesse contexto, seríamos capazes de trabalhar oito horas por dia sendo altamente criativos ou estratégicos se tarefas repetitivas fossem lançadas sobre nós? É improvável que possamos manter um ritmo tão intenso sem uma pausa mental.
Seja qual for o futuro dos negócios e da IA, é fundamental ter em mente a importância da educação e da conscientização sobre o assunto. Devemos discutir o tema também em ambientes familiares, salas de aula, empresas e espaços políticos para entender os riscos e os benefícios que a IA pode apresentar, assim como garantir que ela se desenvolva de forma produtiva e em benefício da humanidade. Incentivar o debate é essencial para moldar um futuro de trabalho mais sustentável e equitativo.
* Agustín Huerta é vice-presidente sênior de tecnologia da Globant.