As estatais Serpro e Dataprev passam a partir de agora a controlar os dados sensíveis de governo numa infraestrutura de nuvem própria, que deverá alcançar informações espalhadas por 250 órgãos federais integrantes do SISP – Sistema de Administração de Recursos de Tecnologia da Informação. Os dados estarão numa nuvem de governo e somente as empresas públicas terão acesso, embora os equipamentos sejam de grandes provedores privados de nuvem.
O governo convencionou chamar o projeto de “nuvem soberana”, proposta que traz na realidade uma “soberania relativa”, considerando que os equipamentos que irão atender a essa infraestrutura, além dos serviços, são contratados pelas estatais das big techs.
Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) assinou, nesta terça-feira (12/11), Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com a Dataprev e o Serpro durante a 5ª Reunião da Comissão de Coordenação do Sistema de Administração de Recursos de Tecnologia da Informação (SISP).
“A nuvem de governo ou nuvem soberana representa uma infraestrutura fundamental para a segurança e soberania digital do país. Ao concentrar dados governamentais e serviços nesta nuvem, gerida exclusivamente por órgãos públicos e empresas públicas, a nuvem de governo fortalece a proteção contra ameaças cibernéticas e assegura que informações sensíveis permaneçam sob controle nacional”, disse a Ministra Esther Dweck, em vídeo gravado especialmente para participar da reunião.
Na prática, a medida que está sendo tomada acaba com uma série de feudos no governo, que se consideravam donos dos dados dos cidadãos brasileiros. A infraestrutura tem o mérito de garantir ao governo uma visão do todo e, a partir daí, ter capacidade de promover políticas públicas com maior grau de precisão nos objetivos finais e evitando duplicidade de iniciativas.
“Esse é um passo fundamental para construirmos a Infraestrutura Nacional de Dados (IND), algo que o presidente Lula tem chamado a base de dados do Brasil. A consolidação da IND vai garantir a segurança e a soberania que precisamos para que tenhamos interoperabilidade, ampliando o uso estratégico das informações para a melhoria dos serviços públicos, a garantia dos direitos e o combate às fraudes”, complementou Dweck.
A IND constitui um conjunto de normas, políticas, arquiteturas, padrões, ferramentas tecnológicas e ativos de informação, com vistas a promover o uso estratégico dos dados em posse dos órgãos e das entidades do Poder Executivo federal. Para estabelecer essa iniciativa, o governo publicou o Decreto nº 12.198, de 24 de setembro de 2024.
A Nuvem de Governo é uma das iniciativas da IND. Desde 2023, o ministério já vem trabalhando para o estabelecimento dessa nuvem com a definição do modelo de contratação de software e de serviços de computação em nuvem a partir da publicação da Portaria nº 5.950. O objetivo do governo é estabelecer um ecossistema robusto de dados públicos para assegurar a autonomia tecnológica nacional, a integridade e a segurança das informações e a privacidade dos cidadãos. De acordo com o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA), prevê o investimento de mais de R$ 1bi no desenvolvimento dessa ação.
A partir da assinatura dos ACTs, o MGI será o primeiro órgão cliente das empresas públicas de tecnologia para atender às demandas do Centro de Serviços Compartilhados do ministério, o Colaboragov, que é promovido pela Secretaria de Serviços Compartilhados (SSC). Esse programa visa a estruturação do novo modelo de compartilhamento de atividades de suporte administrativo, realizadas de forma colaborativa entre ministérios. Até o momento, essa iniciativa atende 13 pastas.
Catálogo
Uma das iniciativas estabelecidas pelo acordo será a elaboração de um Catálogo de Serviços de Nuvem de Governo. Nesse catálogo, também estarão disponíveis para todos os órgãos as condições dos serviços que serão prestados, como o preço máximo da contratação e os níveis de serviços que serão prestados pelas duas empresas públicas. O catálogo completo será divulgado no próximo mês.
Outra novidade em relação à Nuvem de Governo é a possibilidade de estados e municípios fazerem adesão voluntária para utilizar esse catálogo de serviços. O objetivo é uma maior proteção dos dados dos brasileiros e ampliar a transformação digital desses entes da federação.
“Houve uma negociação importante, envolvendo as duas empresas, para que a gente tivesse estabelecido um valor de referência. A gente trabalha na referência de até R$ 2,30 a unidade de serviço de nuvem para a Infraestrutura como Serviço (IaaS) em acordo com as duas empresas, para que isso tivesse uma oferta que fosse palatável na hora que os órgãos queiram fazer essa adesão e contratação junto às duas empresas públicas”, afirmou o secretário de Governo Digital, Rogério Mascarenhas.
Dataprev
Para o presidente de Dataprev, Rodrigo Assumpção, esta é uma oportunidade para promover a organização dos dados dos sistemas de governo e para isso ocorrer, é necessário dar condições de trabalho. “O gestor público precisa necessariamente ter uma alternativa que lhe permita cumprir as suas tarefas e as suas obrigações. E nenhum gestor público aceitaria retroceder nas capacidades que hoje já tem acesso. Está na mesa uma oferta que não retrocede em nada nas melhores capacidades disponíveis no mercado”, explicou.
Até o momento, a Dataprev fez contratos com a Amazon Web Services (AWS), Huawei e Oracle para o estabelecimento da Nuvem de Governo. As nuvens desses fornecedores serão instaladas dentro dos data centers das empresas públicas, possibilitando uma maior segurança de dados restritos, como fiscais e bancários, por exemplo. Há a expectativa de que outras grandes empresas procurem as estatais para fecharem acordos.
Serpro
O Serpro continua devendo o anúncio oficial da sua “nuvem soberana”, que estava previsto para outubro, mas até hoje nada de concreto foi mostrado pelo presidente, Alexandre Amorim. Que nem apareceu para a assinatura do acordo com o Ministério da Gestão. Uma característica marcante já detectada em outras ocasiões e eventos de governo.
Até cerca de um mês atrás a estatal mal tinha um diretor de Operações para concretizar os acordos com as big techs. Com a recente entrada de Wilton Mota na diretoria – que já pegou um contrato duvidoso em seus objetivos pela proa, de R$ 350 milhões do Serpro com o Google – existe a possibilidade agora da empresa pública deslanchar no projeto encalhado desde 2022.
“A experiência que a gente tem de prover o serviço para o Estado garante que a operação seja soberana, que a administração desses dados, dentro dos nossos centros de dados, será soberana. É uma honra ter participado desse acordo e nós estamos preparados para prover o serviço”, encerrou o diretor de Operação dos Serpro, Wilton Mota – representando o eterno ausente Alexandre Amorim.
*Com informações do Ministério da Gestão.