No Plano de Ação 2021 da Dataprev ficou claro que a empresa gastou todo o tempo necessário para fazer caducar a decisão tomada pelo Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União – convalidada em um Termo de Ajustamento de Conduta – de acabar com a dependência tecnológica dos mainframes Unisys. Um processo que se arrasta desde o início do Governo Lula e, ao que tudo indica, nunca terá fim.
Segundo o Plano de Ação 2021, a Dataprev já decidiu que continuará mantendo uma “integração de dados entre as plataformas alta e baixa”. O que significa que o CV3, o terceiro mainframe localizado no Rio de Janeiro (unidade do Cosme Velho), permanecerá no mainframe da Unisys, rodando linguagens mortas, cuja dificuldade para se conseguir técnicos no mercado habilitados, por exemplo, em “Cobol” é enorme.
Não bastasse isso, ficou claro agora e está em documento da empresa, que o “TAC – Termo de Ajustamento de Conduta” assinado com a procuradora Raquel Branquinho, virou letra morta. A Dataprev continua não querendo deixar a dependência tecnológica com a Unisys. A mesma empresa que no início do Governo Lula chantageou o Executivo Federal ao ameaçar desligar os computadores, caso não obtivesse um reajuste nos serviços pelo preço que estipulava.
Pelo documento, a previsão fictícia de gasto com essa “integração” até 2025 (o Plano de Ação leva em conta modernizar a empresa até 2025), é de um gasto da ordem de R$ 9 milhões. Sendo que a metade (R$ 4,5 milhões) será executada no ano que vem. Salta aos olhos que o dinheiro orçado só consta para a realização da tal “integração”. Capacitação técnica, pelo visto, vai ficar para outra ocasião.
Também é curiosa a proximidade de valores com o que a Dataprev pretende gastar para melhorar a sua imagem no mercado no ano que vem. Dá uma perspectiva de que se mostrar como uma “grande empresa” é tão prioritário para a direção da Dataprev, quanto manter os serviços funcionando, sem suspeitas de fraudes, ao pagar 63 milhões de aposentados e pensionistas.
Essa “integração” entre as plataformas alta e baixa se dá pelo fato de que a estatal, ao enrolar o tempo todo para se livrar da dependência Unisys, gastou para fazer uma migração. A empresa nos últimos anos chegou a contratar a Accenture por R$ 50 milhões para realizar o rebaixamento do mainframe. Mas o serviço não foi executado e o contrato foi cancelado. “Amigavelmente”.
Na visão de jurista que lida com contratos administrativos federais e foi consultado informalmente por este site, “o processo de rescisão contratual parte do princípio de avaliação do que foi feito. O gestor administrativo, com base no parecer técnico, calcula o que está previsto no edital. Considerando que foi inexigibilidade, um processo de multa pode ser aplicado, cabendo a diretoria aplicar ou não a multa. Ela é calculada baseada na decisão de rescisão (que ela mesma toma baseada em uma nota técnica da área responsável”.
Curiosamente, a Dataprev pagou parte do contrato com a Accenture, não teve o serviço executado, mas cancelou amigavelmente o contrato, sem nenhuma punição pela inexecução deste trabalho. Pelo menos esta é a informação que consta extraoficialmente, pois a empresa, depois de 15 dias de espera, retornou um pedido de informações via Lei de Acesso à Informação (LAI) feito por este site, alegando que não conseguia repassar todos os contratos e renovações feitas com a Accenture.
Não informou como se deu o processo de cancelamento com essa empresa, assim como não informou sequer o quanto pagou para a Accenture até a data em que decidiu cancelar o contrato. Apenas sugeriu a este site que, se quiser ver os inúmeros contratos que fez e renovou com essa empresa, espere a pandemia do Covid-19 acabar para ter acesso aos documentos físicos. Este site está recorrendo pela LAI em segunda instância para confirmar as informações extraoficiais.
Se confirmadas, é de se estranhar e indagar por que o ex-diretor de Desenvolvimento e Serviços e Relacionamento e Negócios da Dataprev, André Côrte, aplicou dois pesos e medidas contra empresas que supostamente não executaram serviços contratados por ela.
Foi o caso, por exemplo, da Globalweb (num consórcio com outras empresas denominado MG1), que teve um contrato de R$ 17 milhões cancelado, recebeu apenas R$ 3,5 milhões (o consórcio) durante a execução (foi assinado em 2014) e recebeu uma multa de R$ 27 milhões. Além da pena de ficar impedida de contratar com a estatal pelos próximos dois anos. O caso está sendo discutido na Justiça.
André Côrte foi procurado por este site para explicar os critérios que adotou para aliviar a Accenture de suas responsabilidades, ao passo que prejudicava a Globalweb. Mas retornou mensagem alegando que, como estava fora da Dataprev, preferia não se manifestar sobre o assunto, deixando a questão para a nova diretoria da estatal.
Diretoria esta, que parece ter sido premiada por deixar tudo como está. Já que o substituto de André Côrte – Gilmar Queiroz – era o então superintendente da Dataprev-RJ, onde se localiza o CV3 e foi o responsável por nunca ter feito rebaixamento do mainframe Unisys, nem com ordem do Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União. Ele e sua superintendente, Juliana Ferris, uma dupla inseparável dentro da Dataprev que atuou ativamente em todo o processo.
*Para concluir, resta indagar: por onde anda a procuradora Raquel Branquinho e o Tribunal de Contas da União?