Burocracia, desigualdade regional e desvalorização da carreira travam a ciência no Brasil

Em nova rodada de debates da subcomissão da Câmara dos Deputados sobre os entraves à pesquisa científica, a representante da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Reitora da Universidade Federal do Amazonas, Tanara Lauschner, alertou que a base da ciência brasileira está fragilizada pela desvalorização de recursos humanos, pela burocracia excessiva e pela concentração regional de investimentos. Segundo ela, sem políticas de valorização das carreiras científicas e sem estabilidade financeira para pesquisa de longo prazo, o país corre o risco de perder competitividade e comprometer sua soberania tecnológica.

“O coração da ciência são as pessoas que a fazem acontecer: pesquisadoras, estudantes, técnicos e gestores. Sem valorização, não há inovação”, afirmou a Reitora.

A defesa de políticas consistentes de formação, remuneração e reconhecimento profissional, com bolsas de pesquisa compatíveis com o custo de vida, foi unânime. Também foi destacada a necessidade de trajetórias de carreira estáveis, capazes de oferecer perspectivas de crescimento e atrair novos talentos.

Outro ponto enfatizado foi o da diversidade na ciência. As falas defenderam a inclusão efetiva de mulheres, povos indígenas, quilombolas e grupos historicamente sub-representados na produção de conhecimento. “A ciência se enriquece quando reflete a pluralidade de vozes e saberes do país”, disse Tanara Lauschner.

Burocracia e fragmentação normativa

A burocracia foi novamente apontada como um dos maiores gargalos estruturais da pesquisa nacional. O ambiente regulatório atual, segundo os debatedores, é caracterizado por excesso de normas sobrepostas e divergências procedimentais entre órgãos de fomento e controle.

Os modelos de gestão variam conforme a origem do recurso — CAPES, CNPq, Finep, Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa, empresas ou convênios internacionais —, o que impõe procedimentos distintos, prazos incompatíveis e regras contraditórias.

“Cada edital exige um tipo de contrato, um modelo de prestação de contas e uma sequência de trâmites que, na prática, inviabiliza a celeridade. Universidades perdem projetos porque não conseguem executar recursos a tempo”, relatou uma Reitora.

O problema se agrava na importação de insumos científicos, ainda limitada por tetos abaixo das necessidades reais dos editais de fomento. Mesmo o programa Importa Fácil, citado como avanço, não cobre a demanda crescente. “Há um descompasso entre as políticas de fomento e os mecanismos de importação”, admitiu uma representante do CNPq.

Desigualdade regional e falta de infraestrutura

A concentração de infraestrutura científica nas regiões Sudeste e Sul continua sendo um dos principais fatores de desequilíbrio no sistema nacional de CT&I. Instituições do Norte, Nordeste e Centro-Oeste enfrentam carência de equipamentos, baixa conectividade e dificuldade de fixar pesquisadores.

“Essas regiões têm papel estratégico para o desenvolvimento territorial, mas ainda operam com orçamentos limitados e estruturas frágeis. É preciso uma política nacional de simetria científica”, destacou a Reitora da UFAM.

Tanara Lauschner participou de audiência pública nesta terça-feira (04) na Subcomissão Especial da Câmara dos Deputados, destinada a avaliar os “Impactos dos Entraves Burocráticos sobre a Atividade de Pesquisa Científica no Brasil”.