MCTI interfere em eleição da Softex e passa “controle” para empresários de Pernambuco

Em uma reunião tensa ocorrida na terça-feira (05) na Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex), foi escolhido “por aclamação” o novo presidente dessa organização, que executa um orçamento de R$ 1 bilhão oriundos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Depois de 14 anos à frente da Softex, o empresário Ruben Delgado perdeu o cargo (lado direito da montagem), mas acabou se contentando com a “Diretoria de Relações Institucionais”. A presidência da Softex Nacional, após pressão política da ministra Luciana Santos, passou para as mãos do executivo do Distrito Federal, Cristian Tadeu (centro da montagem), que já ocupa o cargo de presidente da Confederação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional), uma entidade de empresas privadas.

A missão dele será destravar dentro da Softex e do próprio MCTI, uma série de exigências requeridas para a liberação de uma bolada de R$ 27 milhões; que serão aplicados num projeto de capacitação de profissionais e estudantes no Estado de Pernambuco, terra natal e base eleitoral de Luciana Santos.

A Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex) é classificada como uma Organização Social Civil de Interesse Público (OSCIP) e controla um orçamento estimado em R$ 1 bilhão destinado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações para a execução de políticas públicas de interesse do governo e da classe empresarial.

O Conselho de Administração da Softex é formado pelos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI); Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC); Agricultura e Pecuária (MAPS). Conta ainda com representantes do CNPq e dos bancos de fomento FINEP e BNDES. Além do governo, conta com oito entidades dos setores de Software, Hardware e Microeletrônica e representantes da Academia. Outros nove “associados” privados se somam ao grupo junto com as regionais da Softex.

Ao substituir o longevo presidente na Softex, Ruben Delgado, que ocupava a função há pelo menos 14 anos e foi o responsável por toda a montagem da estrutura da organização social junto ao MCTI, a ministra Luciana Santos quebrou pela segunda vez um feudo dentro de entidades que orbitam o ministério e sustentam seus projetos através de dinheiro publico. A primeira ação foi na RNP – Rede Nacional de Ensino e Pesquisa, ocorrida no início do ano. Porém, a decisão de Luciana tem menos a ver com a ideia de moralizar a ação dessas entidades, do que o interesse do PCdoB em aparelhar e ganhar acesso ao dinheiro público que circula nesses organismos paraestatais.

Na tentativa de um acordo, foi sugerido que Ruben permanecesse na presidência até abril do ano que vem. Mas Cristian precisou consultar “seus pares” que não estavam na reunião. Quem seriam esses “pares” que precisavam ser “consultados” por um candidato a presidente da Softex? Ninguém soube informar, pois Cristian saiu da sala da reunião para conversar com eles. Acabou que a proposta de Ruben não foi aceita pelos “pares” de Cristian Tadeu. Situação inusitada que levou a alguns dos presentes questionarem sobre quem administrará a Softex no futuro: Cristian Tadeu ou os “seus pares”?

Ninguém é santo nessa disputa pelo comando da Softex Nacional. Não consegue se manter 14 anos no comando de uma organização social, sem sustentar um esquema de concessões de favores a políticos e empresas. Além disso, precisa contar com o apoio irrestrito do MCTI para se sustentar no cargo. Desta vez Ruben Delgado encarou uma ministra que tem outros interesses políticos e eles não passaram pela permanência dele no cargo.

Após o impasse criado, o Conselho de Administração da Softex achou por bem aprovar Cristian como indicação da ministra Luciana Santos, mas adotou uma solução Salomônica mantendo Ruben Delgado na “Diretoria de Relações Institucionais da Softex” além do atual vice-presidente, Diônes Lima. Depois de resolvida a confusão, a entidade divulgou em sua rede social ontem (06) a notícia de que Cristian Tadeu foi eleito para a presidência da Softex Nacional “por aclamação”. Com direito à montagem da imagem dele ao lado dos seus adversários e desafetos eleitorais num clima de “amor pela causa e união”, que nunca existiu.

Padrinhos fortes que desejam lucrar no MCTI

Italo, Diogo e Yves (esq. para direita), empresários vão controlar orçamento da Softex.

Para gerir a Softex, pelo menos nesse projeto capacitação em TI de interesse da ministra, Cristian Tadeu deverá se reportar diretamente aos seus “padrinhos” pernambucanos, que são três irmãos e empresários da área de TI e donos de outros negócios e investimentos. Um dos irmãos é o atual presidente da Softex-Recife, Yves Nogueira. Os outos dois irmãos são: Ítalo Nogueira, que já foi presidente da Assespro Nacional e seu mandato antecedeu ao de Cristian Tadeu. O terceiro é Diogo Nogueira, administrador e sócio dos irmãos na empresa Yolo (foto acima ao centro).

Yves Nogueira, como presidente regional da Softex, no Recife, decidiu contratar a empresa de informática CMTECH Comércio & Serviços Ltda – de propriedade do irmão Ítalo Nogueira. A Softex orçou em R$ 3 milhões a aquisição de uma nova plataforma educacional e a CMTECH numa disputa de preços com outras duas concorrentes e mesmo sabendo do conflito de interesses, apresentou o menor valor: R$ 2,997 milhões. Funcionários do MCTI gestores do projeto recomendaram utilizarem sistemas já adquiridos pela organização, mas a Softex-Recife manteve a decisão de contratar a empresa de Italo Nogueira para a realização do serviço.

A presença do presidente da confederação (Assespro), entidade formada empresas privadas de Tecnologia da Informação, no comando de uma Organização Social vinculada ao MCTI, poderá colocar eventualmente o governo na desconfortável situação de ter de explicar futuramente aos organismos de controle a escolha que andou fezendo, por exemplo, de determinadas empresas que participarão de projetos ao custo de milhões de reais.

Embora a Assespro e outras entidades representativas de empresas privadas façam parte da Administração da Softex Nacional, em 14 anos nunca houve registro da presença desses empresários no comando direto da OSCIP. Ainda mais exercendo simultaneamente as mesmas atividades em outras associações do setor de tecnologia, como é o caso de Cristian Tadeu na Assespro Nacional. Fica a indagação: não haveria conflito de interesses a presença de Cristian Tadeu como presidente da Softex, onde irá ordenar despesas em nome do MCTI para empresas privadas prestarem serviços de informática, nas políticas públicas do governo?

Essa promiscuidade entre o interesse público e o privado já pode ser constatada em Pernambuco, terra da ministra Luciana Santos. É evidente que ela e o marido têm iteresses políticos no Estado, onde se espera que a ministra deixe o cargo em abril do ano que vem para disputar uma vaga à Câmara dos Deputados.

Foto: Luara Baggi (ASCOM/MCTI)

O interesse de Luciana no projeto da Softex ficou patente, quando ela se dispôs a participar remotamente do lançamento de uma “aula inaugural” do programa “Bolsa Futuro Digital”, lançado no último dia 1º de agosto pela Softex de Pernambuco. Acompanhada do secretário de Ciência e Tecnologia para Transformação Digital, Henrique de Oliveira Miguel, Luciana aproveitou para falar de tudo; até da “interferência política do presidente norte-americano, Donald Trump“, com a aplicação do tarifaço ao Brasil.

O Programa

O “Bolsa Futuro Digital” é o nome escolhido para a proposta de projeto da Softex feita ao MCTI conhecida por “Capacitação 02 – Conecta e Capacita”, que prevê a “capacitação de profissionais e estudantes para atuarem diretamente na área de desenvolvimento de software, diminuindo, assim, o crescente déficit de profissionais com esse perfil no mercado brasileiro”- explica cópia do objeto dele, em poder deste blog. Numa nota oficial divulgada pela Assessoria de Imprensa do MCTI, foi explicado que o programa será de 24 meses com a formação de 10 mil profissionais e alunos em 12 Estados.

O Estado de Pernambuco, foi agraciado com recursos da ordem de R$ 27,3 milhões. O dinheiro foi alocado pelo MCTI após a aprovação do Comitê de Área de Tecnologia da Informação (CATI), organismo responsável pelas aplicações de recursos de custeio nas atividades de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), previstos desde 1990 pela Lei de Informática. Eles fazem parte dos Projetos Prioritários de Interesse Nacional (PPIs).

O desembolso dos recursos se dará da seguinte forma:

O Centro de Excelência em Tecnologia de Software do Recife (Softex), apresentou para a Softex Nacional um quadro contendo as despesas para execução dele:

A proposta desse programa foi analisada, aprovada com algumas recomendações e assinada digitalmente por cinco coordenadores do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). Como esses funcionários não pretendem aprovar nada que possa configurar desvio de conduta, pediram algumas correções no projeto.

Embora ele já tenha sido lançado pela ministra em Pernambuco, administrativamente continua pendente. Porém parte do dinheiro já pode ter sido transferido para o Recife e já deveria constar a prestação de contas. O blog solicitou todos os dados ao MCTI, mas a demora é de 15 dias para a resposta. Toda essa confusão terá de ser resolvida agora por Cristian Tadeu à frente da Softex Nacional. Haja “salário” para valer a pena tanto aborrecimento.