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Já sabiam da surpreendente notícia divulgada em 27 de maio deste ano, por parte do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), de que celebrou um memorando de colaboração com a CISCO?:
“O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e a Cisco assinaram, nesta quarta-feira (27), um acordo de colaboração para impulsionar o desenvolvimento de habilidades e a transformação digital no Brasil. A inciativa MCTIC e Cisco: Acelerando a Transformação Digital foi anunciada durante evento virtual com o ministro do MCTIC, Marcos Pontes, o secretário-executivo, Julio Semeghini, o secretário de Empreendedorismo e Inovação, Paulo Alvim, o secretário de Telecomunicações, Vitor Menezes, e os executivos da Cisco Guy Diedrich, vice-presidente global de inovação, John Kern, vice-presidente sênior e country sponsor do Brazil, Jordi Botifoll, presidente da Cisco América Latina, e Laércio Albuquerque, presidente da Cisco do Brasil. O acordo faz parte de um investimento estratégico da Cisco pelo programa global Country Digital Acceleration, batizado de Brasil Digital e Inclusivo, e lançado hoje também pela Cisco. O programa deve ajudar o país a se preparar para uma nova era de hiperconectividade e economia digital, além de apoiá-lo na recuperação social e econômica, à medida que o Brasil entrar em uma nova realidade pós-pandemia. Com o objetivo de promover o crescimento econômico e o desenvolvimento de habilidades, o programa focará nas áreas de educação, saúde, segurança cibernética, agronegócio, segurança pública, energia e manufatura, a partir de parcerias com o setor público, indústria e academia. As iniciativas relacionadas ao governo do presidente Jair Bolsonaro serão projetadas e executadas em conjunto com o MCTIC”.
O anúncio gerou uma comoção geral, na medida em que fica claro que o governo está entregando atividades estratégicas do Brasil no campo da tecnologia e do controle da administração pública, dos dados de brasileiros e de nossa produção científica, com impacto em big data e segurança, sem que tenha havido consultas públicas e nem mesmo licitação. Destaco que até hoje não houve a publicação do texto do tal memorando anunciado. É um escândalo com proporções incalculáveis para a soberania nacional!
Segundo as informações: “A partir de um acordo de colaboração com o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, assinado nesta quarta-feira, 26/05, e que cria o programa batizado de Brasil Digital e Inclusivo, a Cisco assume a realização de iniciativas para aceleração da transformação digital no Brasil. Uma das ações – que começa a ficar operacional em três meses – foi chamda de Torre MCTIC, que é a CONSTRUÇÃO DE UMA PLATAFORMA DE BIG DATA PARA UNIR TODOS OS DADOS RELATIVOS À PESQUISA CIENTÍFICA NO BRASIL”.
Dado então que o acordo representa, na prática, a privatização de setores fundamentais da administração pública para o desenvolvimento econômico, social e cultural do país, expressas inclusive no Decreto 10.332, de abril deste ano, o acordo deveria ter passado pelo Congresso Nacional.
Diante das profundas repercussões que o acordo pode ter para o país e para a segurança dos dados dos cidadãos brasileiros em larga escala, a bancada do PSOL na Câmara Federal enviou ofício ao MCTIC com requerimento de informações com um questionário que transcrevo abaixo.
![](http://capitaldigital.com.brwp-content/uploads/2020/06/PSOL-OFICIO-MCTIC-CISCO.png)
Por enquanto temos muito pouca informação sobre tudo isso, mas muito a ser revelado, em cumprimento aos princípios da legalidade e publicidade, aos quais o MCTIC está obrigado. Por exemplo, quais são os impactos econômicos e contrapartidas para o Brasil e para a CISCO diante de tamanha vantagem? Ou ainda, como nossos dados serão protegidos no contexto das atividades que a CISCO passará a desempenhar?
Mas que fique claro: estamos de olho!
Segue a íntegra do ofício enviado pelo PSOL ao MCTIC:
Senhor Presidente,
- O Partido Socialismo e Liberdade – PSOL recebeu com surpresa e estranhamento a notícia sobre Acordo entre o governo brasileiro, através do MCTIC, e a fabricante norte-americana de equipamentos de rede CISCO, que teria sido firmado no último dia 27 de maio de 2020, em um memorando de entendimento para acelerar a digitalização no Brasil. De acordo com o documento, segundo informa matéria do site Tele.Síntese , a empresa se compromete a realizar investimentos no país ao longo dos próximos três anos e também buscará parceiros para o desenvolvimento do ecossistema de inovação por meio projetos pilotos.
- O Acordo, segundo relata o próprio site do Ministério, faz parte de um investimento estratégico da CISCO pelo programa global Country Digital Acceleration, batizado de Brasil Digital e Inclusivo . A assinatura do acordo teria sido realizada em cerimônia virtual, transmitida pela internet, com a presença do corpo do MCTIC, com o Ministro Marcos Pontes e os secretários Júlio Semeghini (executivo), Vitor Menezes (telecomunicações), Paulo Alvim (empreendedorismo).O Ministério da Economia sequer foi avisado, segundo matéria do Estado de S. Paulo, rompendo a praxe de análise conjunta de Ministérios neste tipo de acordo . Como alerta a Associação Brasileira de Profissionais Autônomos de Startups e de Desenvolvimento de Tecnologias, tudo indica que o Acordo foi feito sem licitação, sem qualquer tipo de chamamento público, sem transparência e sem a participação da sociedade civil por meio de audiências públicas.
- O programa focará nas áreas de educação, saúde, segurança cibernética, agronegócio, segurança pública, energia e manufatura avançada, ou seja, áreas com informações sensíveis que poderão ser acessadas pela empresa estrangeira. Um dos primeiros projetos resultantes do acordo será, inclusive, a criação de uma ferramenta para mapear iniciativas de pesquisa e inovação, batizada de Torre MCTIC, por meio de uma ferramenta da CISCO que será alimentada com dados públicos fornecidos pelo próprio Ministério, por instituições de ensino e por organizações privadas de fomento e inovação que quiserem aderir. Trata- de um verdadeiro absurdo, ainda mais considerando que a CISCO foi citada no caso Snowden como uma das empresas a fornecer dados ao governo americano .
- É grave que ainda não se tenha detalhes do referido Acordo. O presidente da CISCO, em coletiva após a assinatura, disse apenas que “em troca” dos “excelentes” investimentos que farão, o MCTIC cederá funcionários, informações e concordará com os termos da CISCO. Ou seja, pode-se aventar a possibilidade que uma empresa norte-americana dará ordens a um Ministério brasileiro.
- Por isso, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI), Lei n° 12.527, de 18 de novembro de 2011, e no dever Constitucional que Parlamentares fiscalizem o Poder Executivo Federal, -, solicitamos com urgência as seguintes explicações: a) Quais os termos desse Acordo? Favor enviar cópia do Acordo e de todo o processo que o envolve.
b) Por que não houve licitação e análise conjunta de outros Ministérios? Qual o fundamento legal para a dispensa de licitação?
c) Quais as justificativas legais para escolha da CISCO?
d) Quem foi consultado para o Acordo? Houve consulta pública? Houve participação de universidades, empresas de tecnologia e empresas ou outros interessados do setor?
e) Outras empresas internacionais e nacionais foram chamadas para também apresentarem suas propostas?
f) Que dados nacionais serão disponibilizados para a CISCO? Se a resposta for afirmativa, quais serão os dados?
g) O Governo Brasileiro terá também acesso a esses dados? De que forma?
h) Como o MCTIC pode garantir a segurança de dados sigilosos neste caso?
i) O Acordo traz cláusulas que estabeleçam limites e regramentos para o uso de dados coletados, de acordo com a legislação brasileira de proteção de dados?
j) Haverá transferência de tecnologia para o Brasil?
k) Qual o investimento do governo brasileiro e da CISCO na proposta? Há a previsão de quais contrapartidas por parte da CISCO? E qual a metodologia econômica aplicada para a valoração econômica do acordo?
l) Os sistemas que a CISCO implantará serão abertos e interoperáveis, permitindo que a indústria brasileira desenvolva soluções tecnológicas e elas possam ser aplicadas em todo o País? Quando outras empresas desenvolver um produto/serviço, ele terá que submeter a aprovação, ou desenvolver com base em padrões CISCO para que tais soluções desenvolvidas “conversem/se conectem” com as tecnologias da CISCO?
m) Como será a participação de empresas nacionais que desenvolveram tecnologias abertas e querem participar do mercado Brasileiro e que não seguem o padrão da plataforma da CISCO?
n) A atividade do SERPRO e/ou DATAPREV estarão afetadas pelo acordo firmado entre MCTIC e CISCO? Se sim, quais os efeitos do acordo na atividade das referidas empresas?
o) Existem previsões, expectativas ou tratativas que limitem a definição das regras para a licitação que se dará para a implantação da tecnologia 5G no país?
p) Como fica a participação de outras empresas de tecnologia da informação e comunicação que investem no Brasil?
q) Quantos e quais funcionários públicos, ou quantas horas de trabalho de servidores públicos o MCTIC e outros ministérios vão disponibiliza para o trabalho junto à CISCO?
r) O Acordo firmado entre o MCTIC e a CISCO implica, em certa medida, a privatização de atividades relacionadas a estratégia digital brasileira. Sendo assim, o Congresso Nacional foi informado ou consultado a respeito dos termos do acordo?
s) Qual o teor do projeto Torre MCTIC?
Contando com sua compreensão, subscrevemo-nos, respeitosamente,
Fernanda Melchionna Líder do PSOL na Câmara dos Deputados
Áurea Carolina David Miranda PSOL/MG PSOL/RJ
Edmilson Rodrigues Glauber Braga PSOL/PA PSOL/RJ
Ivan Valente PSOL/SP
Luiza Erundina PSOL/SP
Marcelo Freixo Sâmia Bomfim PSOL/RJ PSOL/SP
Talíria Petrone PSOL/RJ
* Flávia Lefèvre – Advogada e Mestre em Processo Civil pela PUC/SP