Na sessão desta segunda-feira (13) do Conselho Diretor da Anatel, o conselheiro Moisés Queiroz Moreira pediu vista ao voto do relator da revisão do edital de leilão do 5G, Emmanoel Campelo de Souza Pereira, e conseguiu a ira do ministro das Comunicações, Fabio Faria. O conselheiro tomou a decisão de não passar por cima de procedimentos “recomendados” pelo TCU, para garantir o cumprimento dos prazos para leilão das frequências em outubro. Como deseja o ministro.
Moisés fez o pedido de vista, não porque tenha vontade de se indispor com o Ministério das Comunicações. Sua decisão foi tomada, simplesmente porque o MCOM não cumpriu a sua parte no Acórdão do TCU proferido pelo ministro Raimundo Carreiro. O tribunal não obrigou a Anatel refazer a íntegra do edital naquilo que considerou como irregularidade. Mas deu um aviso aos gestores da agência e do ministério, na forma de “recomendação,” para corrigirem o texto antes da venda das frequências, porque estão em sério risco de responderem futuramente por danos ao erário.
Fabio Faria não escondeu a sua ira numa entrevista à imprensa logo após o pedido de vista ocorrido na sessão da Anatel e deturpou uma série de informações para construir a sua narrativa de que o leilão do 5G não sai por causa de atrasos injustificados.
Em nota oficial, Moisés explicou que, embora estivesse na “desconfortável posição” de fazer o pedido de vista, este se baseava no fato de que o Ministério das Comunicações não cumpriu a sua parte do Acórdão do TCU, o que significa que, se a Anatel aprovar o edital como está, no futuro quem responderá por eventuais erros em tomadas de contas do tribunal será o corpo técnico e o Conselho Diretor da agência reguladora. E não o ministro-político, Fabio Faria, que tem o seu “foro privilegiado”.
“Por mais que eu não pretendesse o pedido de vistas, esse assunto está me trazendo desconforto, uma vez que sou responsável, juntamente com meus colegas de Conselho, por responder pela presente deliberação junto à Corte de Contas”, destacou Moisés em nota oficial, após a sessão da agência.
Políticas sem projetos
Até agora sabe-se apenas que o Ministério das Comunicações quer uma rede privativa e segura para o governo e a execução do programa PAIS (Amazônia Integrada e Sustentável), ao custo para os cofres públicos de R$ 2,5 bilhões. Esse dinheiro não sairá diretamente do Orçamento da União, mas através de compromissos que as operadoras terão de cumprir, como contrapartida ao “leilão não arrecadatório” das frequências do 5G. Ou seja, elas constroem as duas redes para o governo, em troca de pagarem simbolicamente o preço das frequências que irão comprar. Não precisam desembolsar no dia do leilão para pagamento das licenças de exploração do serviço móvel.
Há ainda outro ponto obscuro na questão da rede privativa. O ministério das Comunicações não tem sido claro sobre como pretende criar uma entidade privada para gerir a construção da rede segura para o governo, se a competência legal – convalidada por decreto presidencial nº 9.612/18) – é da Telebras. Fabio Faria tem jogado no dúbio. Para a plateia diz que a Telebras não será a gestora desta rede, mesmo tendo competência legal, mas não fez nada até agora para retirar a estatal dessas obrigações. Foi justamente nesse ponto que o TCU considerou estranha a situação e novamente “recomendou” que o Ministério das Comunicações esclareça o caso antes de vender as licenças.
O problema para Fabio Faria é escolher qual “senhor” irá desagradar: se ao ministro Paulo Guedes( Economia), que deseja se livrar da Telebras, embora até agora não tenha feito nada nesta direção no PPI (Programa de Parcerias e Investimentos), ou os ministros das Forças Armadas, que veem na estatal uma parceira na gestão da banda militar do satélite geoestacionário. Essas questões só o MCOM pode responder, já que políticas públicas e decisões governamentais, não cabem à Anatel.
Ocorre que o ministro, como bom representante do Centrão, tem feito pressão para que a Anatel venda as licenças sem resolver as questões pendentes levantadas pelo TCU.
“Só que depois ele vai embora e quem fica aqui com o CPF gravado no tribunal para responder pela irregularidade sou eu”, reagiu uma fonte da Anatel.
Fabio Faria não tem limites na sua ambição de aparecer para Jair Bolsonaro como o homem que trouxe investimentos de bilhões de reais da telefonia móvel para o Brasil. Faria quer o 5G a qualquer custo, mesmo que seja passando por cima dos funcionários públicos e de procedimentos legais. Não quer entender que os servidores da Anatel não podem atropelar procedimentos legais e “recomendações” do Tribunal de Contas da União, já que depois responderão pelos atos que tomaram em auditorias futuras. E o TCU deixou claro que elas ocorrerão, pois a implantação do 5G no Brasil será acompanhada de perto pelo tribunal.