Por Jeovani Salomão* – Tanto a sigla TI, utilizada em geral para indicar Tecnologia da Informação, quanto o próprio nome sempre soaram estranhos para mim. Gosto mais da palavra Informática. As definições dos dois termos variam um pouco, dependendo da fonte, mas o fato é que procuram dar significado ao mesmo conjunto de atividades. Independente da terminologia, os softwares e hardwares já invadiram nossas vidas. Internet, redes sociais, troca de mensagens instantâneas, soluções de vídeo chamadas, aplicativos para lazer e negócios são corriqueiros. Entraram sem pedir licença e vieram para ficar.
A semana que passou, no entanto, teve um sabor diferente, porque a TI foi centro de inúmeros episódios significativos na sociedade brasileira e mundial. A invasão do STJ por hackers paralisou o tribunal por alguns dias, tentativas equivalentes foram feitas contra o Ministério da Saúde e a Secretaria de Economia do Distrito Federal. Sabe-se lá quem mais foi alvo dessas abordagens criminosas. O alerta e as precauções devem ser redobrados daqui para frente, porque a sociedade começa a compreender que os serviços públicos são melhores quando digitais, mas, em contrapartida, que ficamos dependentes da TI.
Outro acontecimento histórico ocorreu no STF, felizmente não relacionado com ataques cibernéticos. Há bastante tempo, corria na corte suprema um debate a respeito da correta tributação sobre software. A tese defendida pelos estados é que o imposto adequado a incidir seria o ICMS. É claro que a defesa ocorreu muito menos por crença na correção da tributação e muito mais porque esse é um fator de arrecadação estadual. O ISS que sempre incidiu e, pela decisão do STF, continuará incidindo, é um tributo municipal. Vitória do setor e vitória do país.
Já no Congresso Nacional, deputados e senadores derrubaram o veto presidencial que encerrava com a desoneração (maldito nome!) da folha de pagamento de vários setores, no que se refere ao INSS, dentre eles o de TI. Fiz a observação sobre a infelicidade do termo “desoneração” por esse causar a impressão equivocada de que o setor não quer pagar seus tributos. Na verdade, o que sempre houve, foi uma troca de quando e onde incidir o encargo. O modelo atual, mantido até final de 2021, é muito mais adequado aos informáticos, porque incide sobre o faturamento da empresa, enquanto o modelo anterior incidia sobre a folha de pagamento. Como nosso principal elemento de gastos são pessoas, e considerando que os salários do setor superam o dobro da média nacional segundo o IBGE, arcávamos com custos desproporcionais na fase de investimento para criação de novas tecnologias. Ainda há o problema da “PJtização” – contratação de Pessoas Jurídicas como se fossem colaboradores, utilizado para fugir dos astronômicos encargos sobre a folha. Muitas empresas do setor tiveram que recorrer a essa prática com o intuito de se manterem viáveis. Quando o INSS passou a ser cobrado no faturamento, ficou mais barato contratar e houve uma geração enorme de empregos formais, que estavam em risco se não fosse a derrubada do veto.
A eleição americana trouxe o setor mais uma vez para o centro do debate, em especial em nosso país. Isso porque a Justiça Eleitoral brasileira protagoniza um procedimento eleitoral muito mais seguro e eficiente que o americano. Apenas cinco horas após o pleito, já temos resultados oficiais definitivos. Em nenhum momento do voto eletrônico houve qualquer evidência de erro na apuração. As lendas sobre fraudes e teorias da conspiração sobrevivem apenas no imaginário popular ou no discurso daqueles com interesses políticos. Depender de contagem manual de votos, como se faz até hoje nos Estados Unidos, é se submeter a um processo que, no mínimo, gera espaço para o erro humano. Considerando o poderio dos candidatos à Casa Branca, não é de se duvidar que esquemas de fraude, de parte a parte, podem ter ocorrido. Ainda há um outro elemento vinculado ao episódio, o poder das redes sociais na influência do voto. Para uma grande parcela da população, em especial a mais jovem, a principal fonte de informação é a Internet. Nas eleições anteriores, ocorreu o uso do perfil de mais de 50 milhões de pessoas, pela empresa Cambridge Analytica, que recebeu as informações do Facebook. Uso abusivo de dados pessoais, violação nítida de direitos individuais, com o poder de ter influenciado o resultado. Há quem afirme que o fato foi decisivo para a eleição de Donald Trump. Ironicamente, no pleito atual, em função dos posicionamentos do presidente, há acusações que as redes sociais interferiram severamente no resultado contra ele. Desta maneira, o ganhador das duas últimas eleições americanas pode ter sido o mesmo: o Facebook. O pior é que não existe cláusula que impeça a reeleição de empresas por períodos consecutivos.
Espero que a percepção que nossas vidas estão entranhadas e dependentes da TI fique cada vez mais clara para a sociedade. Eu, por exemplo, tive que interromper a produção do texto para ver a demonstração da minha filha mais nova, Camila (11), performando com sua mais recente aquisição: uma Alexa! Sobre a perspectiva do indivíduo, a TI traz enormes possibilidades, mas sobre o ponto de vista da nação, precisa trazer também grandes responsabilidades. O Brasil precisa entender que ou dominamos a criação de tecnologias da informação ou seremos escravizados pelos países que as produzem.
*Jeovani Salomão é empresário do setor de TICs e ex-presidente do Sinfor e da Assespro Nacional.