A proposta orçamentária do Ministério das Comunicações que está no Congresso Nacional sendo analisada pela Comissão Mista de Orçamento, prevê um total de R$ 3,2 bilhões.
Deste total, o maior orçamento previsto para ser executado este ano está com a Telebras (R$ 862 milhões). Tem mais recurso do que a expectativa de arrecadação do ministério com o Fundo de Universalização dos Serviços das Telecomunicações – FUST, cujo orçamento é de R$ 857 milhões.
É muito? Não.
É uma previsão orçamentária para a estatal até menor do que ela tem de dinheiro em caixa mas não pode utilizar, simplesmente porque o Ministério da Economia, que deseja vender a empresa para a iniciativa privada – e tudo indica que não conseguirá – a colocou como “dependente” do Orçamento Geral da União, mesmo tendo o capital aberto no mercado financeiro.
A previsão orçamentária da Telebras em 2021, que ainda precisa passar pela Comissão Mista de Orçamento, está descrita no seguinte quadro:
Chama a atenção para a perda de R$ 218 milhões do seu orçamento, que terá de ser colocado em “reserva de contingência”, como parte do esforço que a estatal fará dentro da Administração Federal para reduzir o déficit nas contas do governo.
Conecta Brasil
Em 2021 a Telebras destinará R$ 343,2 milhões para custeio e investimentos no programa Conecta Brasil, cuja maior parte está dividida para o custeio da sua rede terrestre.
Então, dos R$ 343,2 milhões, cerca de R$ 250,7 milhões serão canalizados este ano para operação de infraestrutura da rede de serviço de comunicação de dados (R$ 92,4 milhões). Outros R$ 250,7 milhões também irão para custeio de implantação da rede de inclusão digital. Porém R$ 43 milhões serão novos investimentos em projetos de inclusão digital.
No orçamento deste ano, a Telebras ainda pretende aplicar cerca de R$ 71,9 milhões no Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicação Estratégica (SGDC), sendo R$ 48,9 milhões na área de custeio e manutenção dos equipamentos em terra do seu centro de operações e R$ 23 milhões em novos investimentos para melhorar a qualidade de recepção do sinal.
Privatização
Para uma empresa que está com a espada da privatização na cabeça, apontada pelo Ministério da Economia, soa estranho que a Telebras tenha o maior orçamento do Ministério das Comunicações. Ao que parece, as frequências estão embaralhadas nos discursos entre os dois ministérios.
Enquanto a equipe do ministro Paulo Guedes – que no governo respira por aparelhos – continua empurrando com a barriga o discurso de que a venda da Telebras está sendo estudada; no Ministério das Comunicações a equipe do ministro Fabio Faria continua estabelecendo a rede da Telebras como prioritária para a realização de políticas públicas. É o caso do “WiFi-Brasil”, por exemplo, que usa o satélite da estatal como fonte de sinal. Nem entro no mérito do uso militar que tem sido feito com o satélite.
Da mesma forma, a rede da Telebras de fibras ópticas continua sendo expandida, e os contratos com a Eletronet e elétricas que compõem o Grupo Eletrobras, dona das fibras, acabam de ser renovados por mais 10 anos.
5G
A estatal ainda prepara-se para ser a gestora da rede privativa e de segurança do governo, que será construída pelas operadoras que comprarem as frequências no leilão do 5G.
Na semana passada o ministro das Comunicações, Fábio Faria, usou a boa e velha cartilha do Centrão para falar sobre um determinado assunto, sem entretanto dizer nada. Muito utilizada pelo cacique do PSD, Gilberto Kassab, quando foi ministro da Ciência, Tecnologia e Comunicações, no Governo Temer.
Indagado se estaria estudando a mudança do decreto 9.612/2018, que confere à Telebras a competência de gestora da rede privativa do governo, limitou-se a dizer – ‘of course’ – que “continuava analisando o assunto”. Mas preferia aguardar primeiro o pronunciamento do Tribunal de Contas da União que analisa o edital de leilão do 5G apresentado pela Anatel.
A pergunta que eu faria ao ministro neste caso seria: o Ministério das Comunicações está contando com o TCU para definir o papel da Telebras na rede privativa 5G?
Seria a solução dos problemas da vida do ministro, pois ele mataria alguns coelhos com uma só “raquetada” do tribunal. Hoje, do ponto de vista legal, a Telebras é a gestora da rede por força do decreto 9.612/2018. Não por acaso, um decreto criado no Governo Michel Temer, do qual Gilberto Kassab era o ministro que cuidava das Comunicações.
Considerando que Kassab já disse ao UOL certa vez, que vender a Telebras “seria um crime”, como mantê-la agora sem brigar com a equipe econômica?
Simples: basta que o TCU considere a presença da Telebras como “estratégica para a rede privativa 5G do governo”, pois sendo pelas mãos da estatal o governo economizaria tempo numa licitação para lá de complicada, na escolha de uma empresa privada ou um consórcio, que ficaria encarregada da construção e gestão da rede.
E, se é “estratégica” para o governo, então o próprio governo também pode interferir na escolha de fornecedores que as operadoras irão contratar para montar a infraestrutura da rede 5G privativa federal.
E as teles nem podem reclamar, já que não está saindo do bolso delas escolher um fornecedor que seja do agrado do governo, sob a ótica da “segurança”. Lembrem-se que os recursos para a construção dessa rede virão do preço que as teles deixarão de pagar pelas licenças das frequência do 5G.
“A culpa é do TCU”
Também ajudaria ao ministro das Comunicações criar uma nova narrativa na praça, de que o governo precisa rever a venda da empresa “já que o TCU não quer”. Convenhamos, fica muito mais fácil para Fabio Faria dizer que a venda da Telebras – dentro dos princípios que norteiam as “boas práticas liberais” – acabou vetada pelo TCU, e não pelos caciques do Centrão. Paulo Guedes teria de engolir mais essa, depois da Petrobras.
Tudo neste momento não passa de mera especulação, mas convém lembrar que Fabio Faria viajou na “Missão 5G” com três ministros do TCU. E um dos ministros, Bruno Dantas, já deu parecer num processo afirmando que colocar a Telebras como dependente do Orçamento da União traria riscos, pois ela teria de conviver com duas situações jurídicas distintas e incompatíveis sob a ótica da governança.
Para tirar o ranço estatal que o mercado sempre reage contra, bastaria ela voltar à condição de empresa de capital aberto não dependente de orçamento federal. Como tem mais de R$ 900 milhões em caixa sem poder gastar, não alteraria nada na vida financeira da empresa.
Com isso a Telebras voltaria a viver de suas próprias receitas e ainda prestaria contas ao mercado sobre suas atividades através de comunicados que toda S/A é obrigada a fazer à Comissão de Valores Mobiliários.
Sendo assim, ela tira das costas o cheiro de estatal dependente do governo e voltaria a prestar contas aos investidores das suas atividades futuras no mercado de serviços de telecomunicações como o do 5G.
Poderia até aceitar um sócio capitalista para agradar em parte a Paulo Guedes, porém sem o controle societário que continuaria com a União?
*Sim, com a palavra o TCU.