No início de dezembro do ano passado recebi uma denúncia de que um aplicativo inserido no sistema Comprasnet permitiria uma fraude nos pregões eletrônicos para compra de bens e serviços pelo governo, beneficiando quem o estivesse utilizando durante a realização de um certame.
O tal aplicativo ganhou um curioso nome: “Olho de Tandera” – numa alusão ao desenho animado “Thundercats”. Trata-se de uma pedra preciosa incrustada numa espada que permitia os “Thundercats” – combatentes do mal – verem o que seus inimigos estariam aprontando.
Piada? Pode ser, mas se for é de muito mau gosto, já que vem deixando os setores de TI e Telecom preocupados com a lisura dos processos de compras do governo.
Representantes do setor andaram me procurando no início de dezembro passado preocupados quanto a possibilidade de fraude nas licitações de TI e telecomunicações. Segundo um representante de uma empresa, uma pessoa teria entrado em contato para oferecer o tal aplicativo.
Segundo o “vendedor”, o aplicativo permite se conectar ao Comprasnet e, durante um pregão eletrônico, quebrar o sigilo das informações que circulam nesse sistema e ninguém tem acesso. Ele identificaria, por exemplo, todas as empresas que estivessem disputando determinado contrato e que lances estariam apresentando durante a competição.
Em tese, sabendo quem são os competidores fica mais fácil para uma empresa não só identificar quem está no jogo, mas, principalmente, possíveis coelhos que estão puxando a licitação para baixo para ajudar algum competidor parceiro a ganhar o contrato, depois que eles forem impugnados. Sabendo disso, basta acompanhar o competidor subsequente aos coelhos e brigar contra os preços que este apresentar.
Fica mais fácil competir sabendo quem seria o potencial interessado no contrato e até onde ele suportaria competir baixando o seu preço. Como contrapartida financeira pelo uso do aplicativo, o “vendedor” ficaria com um percentual sobre o valor do contrato disputado e vencido pelo fraudador, após o término da licitação.
O problema nesse tipo de fraude é que para o aplicativo rodar com eficácia dentro do sistema Comprasnet, teria que contar com o auxílio de algum funcionário do Serpro, empresa que controla o sistema. Segundo o representante de uma empresa que conversou com o Blog e foi assediado por esse “vendedor”, a garantia dada por ele era que o aplicativo já estaria implantado no Comprasnet.
Procurei outros interlocutores que pudessem confirmar a existência dessa fraude. Ontem conversei com outro que disse ter conhecimento dessa fraude. Segundo essa pessoa, a notícia circula de forma reservada no mercado de informática de Brasília há um certo tempo. E que teria não apenas a participação de um funcionário do Serpro, mas também o apoio de alguém no Ministério do Planejamento.
Desde que recebi a primeira denúncia, tomei o cuidado de checar com empresários essa informação. A maioria disse desconhecer o assunto, mas mostrou-se preocupada com a possibilidade de existência do tal “Olho de Tandera”.
Da mesma forma procurei a direção do Serpro para saber se tinha conhecimento dessa história. Aparentemente sim, pois a informação que recebi extraoficialmente é de que uma auditoria já estaria em curso dentro da estatal e no sistema Comprasnet, para possível identificação de códigos maliciosos, que permitissem a quebra do sigilo das informações processadas durante a realização dos pregões eletrônicos no Comprasnet.
*Até o momento não houve retorno do Serpro sobre os resultados desta auditoria.