
A Agência Nacional de Telecomunicações terá orçamento de R$ 838,36 milhões em 2026, segundo a proposta apresentada no Projeto de Lei Orçamentária Anual analisado pelo Congresso Nacional. O valor representa um crescimento nominal de 9,6% em relação ao PLOA 2025 e de 33,2% quando comparado ao montante empenhado em 2024, indicando uma recomposição moderada dos recursos da agência reguladora. Mas a proposta carrega apenas a sinalização das necessidades de custeio de sua máquina administrativa. Como tem sido excluída dentro do governo dos debates da transformação digital, o orçamento da Anatel não está preparando a agência para atuar em temas que estão diretamente ligados à infraestrutura de Telecomunicações e deveriam entrar no seu radar regulatório, como a expansão dos data centers, da nuvem e a Inteligência Artificial.
O resultado é um paradoxo institucional. A agenda regulatória e legislativa pressiona por Estado mais capaz de normatizar, fiscalizar e coordenar infraestrutura crítica digital, mas o orçamento aponta para estabilidade do custeio e baixa capacidade de investimento e modernização. A recomposição parcial garante a continuidade do funcionamento essencial, porém mantém uma agência mais reativa do que estratégica diante da convergência entre telecom, dados, nuvem e grandes infraestruturas de processamento.
Na comparação com a execução mais recente, a proposta para 2026 também supera em cerca de 21,7% o valor empenhado em 2025, quando a Anatel executou R$ 689,03 milhões. O aumento sinaliza reforço do orçamento operacional, mas não altera de forma significativa o perfil estrutural de gastos da autarquia.
A estrutura orçamentária da Anatel permanece fortemente concentrada em despesas correntes e obrigatórias. O parecer setorial indica que a agência segue dependente majoritariamente de recursos destinados à manutenção administrativa, fiscalização, gestão do espectro e funcionamento institucional, sem previsão relevante de investimentos. Na prática, os investimentos diretos seguem residuais, o que limita a modernização interna e o reforço tecnológico da máquina regulatória.
Dentro do orçamento total do Ministério das Comunicações, estimado em R$ 2,3308 bilhões para 2026, a Anatel responde por aproximadamente 36% dos recursos, consolidando-se como a maior unidade orçamentária individual da pasta.
Esse descompasso torna-se mais evidente diante da ampliação contínua das atribuições da agência no ecossistema digital. A Anatel deixou de atuar apenas como reguladora clássica de serviços de telecomunicações para lidar com redes privadas, satélites de baixa órbita, compartilhamento de infraestrutura, uso intensivo de espectro pelo 5G e novas arquiteturas de rede. E, cada vez mais, passa a operar na fronteira entre telecomunicações, data centers e serviços de nuvem, áreas que dependem diretamente de backbones nacionais, interconexão, espectro e resiliência de infraestrutura.
No próprio ciclo recente, a agenda regulatória e institucional passou a incorporar data centers de modo mais explícito. Há movimentação no Congresso em torno de políticas públicas para processamento e armazenamento digitais, como o PL 1.680/2025, que motivou audiências públicas sobre desafios e oportunidades do setor.
No Executivo e no Legislativo, o tema ganhou tração com o REDATA, instituído por MP 1.318/2025, voltado a incentivar a instalação e modernização de data centers, com necessidade de validação congressual.
Do lado infralegal, também cresce a sinalização de que parte dessa infraestrutura entra no radar regulatório quando integrada às redes. A Anatel, por exemplo, passou a prever avaliação de conformidade/homologação para data centers que integrem redes de telecomunicações em sua regulamentação. E o próprio debate público interno da agência já vem tratando de segurança e operação de data centers, mas em instâncias consultivas.
O problema é que, enquanto o assunto “data center + nuvem + soberania digital” se torna pauta recorrente, o desenho orçamentário setorial do Ministério das Comunicações vai na direção contrária no item que normalmente dá musculatura a políticas públicas: investimento. Os investimentos do ministério, que em 2025 já tinham execução fraca, caem para R$ 113,93 milhões em 2026, ante R$ 257,24 milhões propostos em 2025. E o histórico recente expõe a subexecução: em 2025, dos R$ 158,98 milhões autorizados, foram empenhados R$ 69,69 milhões.
Nesse contexto, os fundos setoriais ajudam pouco a reverter o quadro. Em 2026, o FUST permanece em R$ 30 milhões, e o FUNTTEL sobe para R$ 30 milhões. São valores pequenos frente à agenda de universalização, inovação em redes e aos requisitos de infraestrutura do “novo ciclo” digital que envolve data centers e computação em nuvem.
ANPD/CGI.br
Se a discussão sobre “soberania digital” envolve também proteção de dados e governança da internet, o financiamento institucional ajuda a explicar o alcance real de cada ator. No PLOA 2026, a ANPD aparece com R$ 15.486.202 na ação de gestão de políticas de proteção de dados. Ínfimo, se compara as atribuições que terá pela frente. É um orçamento muito inferior ao das grandes agências setoriais, o que limita capacidade de escala regulatória e de fiscalização em um cenário de digitalização acelerada.
Já o CGI.br não é uma autarquia federal com dotação orçamentária típica no PLOA, porque sua operação está ligada ao ecossistema do NIC.br/Registro.br, uma entidade civil sem fins lucrativos, sustentada principalmente pelas atividades do Registro.br, que administra domínios “.br” e serviços associados. Na prática, isso significa que parte relevante da governança multissetorial da internet no Brasil se apoia em uma fonte de financiamento fora do orçamento fiscal tradicional, com dinâmica própria e resultados duvidosos.







