Dentro da estratégia de fazer engenharia reversa em programas de governos alheios, para depois reconstruí-los como se fossem novidades para os eleitores, a candidata à Presidência, Marina Silva, propõe “democratizar a democracia”, diminuindo a distância do cidadão aos serviços do governo através da telefonia celular.
A candidata, ao que parece, desconhece o valor de uma tarifa de SMS, que inviabilizou várias iniciativas de governo eletrônico em estados, municpios e no governo federal. Hoje os serviços de M-Gov disponíveis, em sua maioria não passam de serviço de mensageria. Mas ao que parece Marina Silva quer mais:
“A proposta da coligação é aproveitar a penetração desses equipamentos de telefonia celular e criar e incentivar um ecossistema de plataformas de informação e gestão participativa para diferentes temas e prioridades, facilmente acessáveis por estes dispositivos”, diz o programa do Governo Marina Silva.
Antes que algum incauto diga: “mas a Marina poderá usar, por exemplo, o whatsApp, ou alguma ferramenta similar que seja de graça”, já antecipo que esse serviço multiplataforma de mensagens não é e nem nunca foi de graça. Nada sai “de graça” da rede das empresas de telefonia.
Recomendo que o leitor atente para o que diz o próprio Whatsapp em sua página: “Enviar e receber mensagens e arquivos de mídia pelo WhatsApp é gratuito, considerando que você tenha um plano de dados de internet adequado no smartphone e um plano de assinatura com o WhatsApp”. O primeiro ano é gratuito, depois virá a cobrança nesse serviço de mensagens.
Traduzindo: compre um pacote de dados em uma operadora celular, se quiser usar serviços de mensagens. Não tente passar dados (texto, imagens, filmes) além do previsto em seu pacote, para não pagar mais caro pelo excedente.
Ainda que esses argumentos não satisfaçam ao leitor, passemos então para a análise da rede móvel brasileira. Primeiro, mais de 80% de nossa planta celular é compreendida de celulares pré-pagos. A população não dispõe de dinheiro para pagar planos de dados oferecidos pelas operadoras.
Neste caso, cai por terra o desejo da candidata de “criar e incentivar um ecossistema de plataformas de informação e gestão participativa para diferentes temas e prioridades”. O custo da operação seria astronômico e recairia no bolso do cidadão.
O governo poderia bancar (subsidiar) esses serviços para a população? Em princípio, sim, e as operadoras iriam adorar ganhar mais dinheiro por prestar esse serviço de rede ao governo. Resta saber, entretanto, de onde o dinheiro sairia dos cofres do governo, em função de tantas outras prioridades que ele tem.
Para se ter uma idea da dificuldade de implantação de um serviço desses, o Brasil até hoje ainda patina no pagamento móvel. Somente agora alguns bancos já oferecem estes serviços, devido ao custo da operação, nunca revelado. Nem por eles, nem pelas operadoras, que nos últimos anos brigavam para definir quanto cada parte ganharia no serviço.
No fim, ao que parece veio a solução: os clientes arcam com as despesas nas tarifas bancárias, em troca da comodidade de fazer tudo o que um banco oferece em serviços no smartphone.
* Mas subsidiar o M-Gov não está escrito no programa de governo de Marina. Nem de nenhum outro candidato. Quero ver a promessa escrita no papel, apesar de achar que papel aceita tudo.