O coordenador do Grupo de Trabalho de Comunicações na Transição do Governo Lula, Cezar Alvarez, não perde a oportunidade de ficar calado ou pelo menos ser mais explícito. Deu uma entrevista à imprensa na qual fala sobre as críticas que esse grupo faz ao uso de provedores de nuvem no governo federal, com custos e riscos de transferência de dados de brasileiros para o exterior.
Faz sentido?
Em parte sim, mas há quatro anos venho tentando identificar claramente isso e este governo nega informações sobre os contratos que faz alegando “sigilo comercial”, o que torna difícil confirmar se há esse problema. Talvez agora num governo democrático em sua comunicação com a imprensa, coisa que por enquanto é para poucos, se possa esclarecer isso.
Há um número exorbitante de empresas prestando serviços de nuvem para um único governo?
Não. Se a ideia é ter uma “multicloud“, por que seria excessivo ter todas as ofertas de serviços em mãos? O problema, no entender desse blog, não seria a quantidade, mas a qualidade e o foco na adoção dela. Hoje o governo conta com duas nuvens, sendo uma no Serpro e outra na Secretaria de Governo Digital. Gasta-se muito e sabe-se pouco dos resultados alcançados com elas. Sem contar que parece haver dois governos: o do Serpro e o da SGD do Ministério da Economia, operando nuvem com os mesmos provedores, que ganham nas duas pontas e isso não sai barato. Hoje, com as informações disponíveis que tem – já que nem a SGD e nem o Serpro procuraram este blog para falar e quando foram recusaram – a impressão que se tem é que ambas batem cabeça.
Há transferência de dados para o exterior?
É uma incógnita ainda, que se agravou com o apagão na Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), autarquia independente criada para fiscalizar e poderia esclarecer esse assunto, mas até agora está sentada assistindo a tudo.
Dentro de regras claras, transparência na divulgação dos contratos de serviços que expliquem a razão de termos duas nuvens iguais e com os mesmos personagens (provedores), este blog não se opõe à adoção da nuvem. É uma tendência mundial, por que o Brasil ficaria de fora?
Mas Alvarez em entrevistas na imprensa já fala como sendo uma aspiração futura do governo a volta dos grandes data centers para guardar os dados de brasileiros sob custódia federal. Neste caso há uma série de questionamentos.
Desvio de função
O primeiro deles, é que não cabe ao GT de Comunicações decidir se o governo adota nuvem ou data center. Não está na esfera de competência desta pasta definir isso. Quem governa a soberania e a custódia de dados no Brasil é a Secretaria de Governo Digital do Ministério da Economia e não o Ministério das Comunicações. Onde Cezar Alvarez está louquinho para por os pés ou mandar a distância, talvez em uma secretaria a ser criada no Palácio do Planalto ao lado do amigo Lula.
A SGD nesta fase de transição está sendo mais avaliada pelo Grupo de Trabalho de Ciência e Tecnologia do que o de Comunicações. Pelo menos será lá que a secretaria deverá se reunir para fazer um diagnóstico de governo.
Isso não quer dizer que o GT de C&T morra de amores pela adoção generalizada da nuvem no governo federal nos moldes que temos hoje. Mas a equipe perece mais consciente em avaliar criteriosamente isso, antes de sair dando entrevistas para falar sobre o que o futuro governo fará, quando nem tem ideia se efetivamente fará parte dele ou estará na pasta que enfrentará tal problema.
Que dados?
Levar um governo para a nuvem não é tarefa de apenas um governo; é um processo para vários. E durante a execução do projeto é preciso haver foco, metas claras e cobrar resultados. É ilógico pensar que tudo que um governo custodia em suas bases de dados não deve estar na nuvem. Que tudo deve ser guardado num data center, com um custo elevado de armazenagem, segurança, rede, manutenção técnica, entre outros. O Serpro, por exemplo, reclama dos custos e do constante uso de máquina que diversas empresas especializadas em Ciência de Dados fazem ao requisitar informações em seu data center. Queria até cobrar pelo acesso às suas máquinas e pelo tempo de uso. Não seria conveniente neste caso a estatal levar tais informações, que não são sigilosas e podem ser anonimizadas, para um ambiente de nuvem, deixar esse abacaxi com as grandes empresas do mercado?
Sem foco
O gasto de tempo e energia desse povo me espanta. Essa fase da Transição do Governo Lula deveria se ater ao levantamento das condições da máquina administrativa que irá pegar em primeiro de janeiro de 2023. Mas ao contrário, sempre se vê algum “coordenador” disponível para falar com poucos e dizendo coisas fora do contexto estabelecido para atuação do seu Grupo de Trabalho. O GT de Comunicações é um exemplo clássico disso.
*Cezar Alvarez além de estar desatualizado, tem uma capacidade de criar factóides incríveis. Provavelmente estará no próximo governo dando pitacos onde não deve.