E se o objetivo final for a criação da Databrasil?

Até ontem eu não tinha elementos para imaginar o contrário, de que o governo estivesse pensando apenas em se livrar de duas estatais que, nas palavras do secretário das Privatizações, Salim Mattar, ou são “corruptas” ou são “ineficientes”.

Mas depois da publicação dos dois decretos que determinam, na marra, a integração de bancos de dados federais, além de criar o gestor operacional, me bateu a seguinte dúvida: e se o objetivo final for a criação de uma nova empresa pública, enxuta e com o foco no tratamento de dados e a prestação de serviços de governo eletrônico, a partir da extinção das duas atuais?

Os benefícios políticos e econômicos, se pararmos para analisar friamente a atual situação, serão imensos.

Fim do Impasse

Daí a minha suspeita de que a real intenção do governo seria a criação de uma nova estatal, a partir da extinção das demais. Qual o modelo, não sei, mas se o caminho for esse resolveria alguns impasses internos no Ministério da Economia. Uma solução Salomônica para duas correntes que têm pensamentos distintos sobre o papel do modelo estatal no Brasil.

Resolve uma disputa que não é pública mas é visível, para quem desejar enxergar. Hoje no Ministério da Economia tem duas vertentes sobre o papel estatal na área de TI. Um lado, mais fácil de ser enxergado é o da venda total dos ativos federais de Tecnologia, defendido por Salim Mattar. Um discurso que não mudou nada, não evoluiu desde as privatizações das Teles ou da Datamec. A boa e velha mania de irrigar as contas públicas vendendo ativos e se retirando supostamente de atividades econômicas que seriam inerentes ao mercado privado.

Do outro lado estão aqueles que entendem que há em curso no mundo uma nova revolução industrial e que ela está intimamente ligada à transformação digital. Da qual nenhum setor ou atividade econômica estará imune e sobreviverá se não se adaptar à ela. Nem mesmo governos. Essa corrente, bem mais silenciosa, vem despontando no cenário com Paulo Uebel, o Secretário Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital.

Databrasil

Disse que não sei qual seria o modelo de criação, mas imagino como poderia ser, num cenário de resolver os conflitos que existem sobre qual o melhor caminho a seguir, contemplando os dois lados.

Uma nova estatal seria mais enxuta que o atual modelo, no qual o Serpro e Dataprev somam quase 14 mil funcionários. Calculo em algo na casa dos 3.500 a 4 mil, sendo a maioria com o foco voltado a atividade fim.

O maior problema e que seria um requisito necessário para justificar a criação dessa nova empresa foi resolvido ontem, com os decretos que integram os bancos de dados federais, ressalvados os que envolvem defesa, segurança, sigilo fiscal e bancário.

A “Databrasil” (adoro esse nome), que pode até nascer com parte do seu capital social aberto ao mercado privado, cuidaria de guardar os bancos de dados menos sensíveis, para serem trabalhados durante a fase de integração, no sentido do desenvolvimento de novas ferramentas de governo eletrônico, com aplicações voltadas para o atendimento ao cidadão. Claro, tudo levando em conta a legislação pertinente de proteção de dados.

Corpo funcional

O pessoal envolvido com a nova empresa pública, que pode vir a ser uma S/A, sendo o governo o controlador, seria remanejado com a extinção do Serpro e da Dataprev. Com base na escolha dos melhores currículos das duas empresas e não importando se são “velhos” ou não, porque o critério será o da competência (ok, novinhos arrogantes, que acham que são a última bolacha do pacote).

Antes que aleguem que o governo não pode extinguir estatais e depois remanejar funcionários de uma empresa extinta para uma nova empresa; que esta seria obrigada a fazer um novo concurso para contratar, lembro sobre os benefícios de ser velho, ter memória e saber um pouco da História do Brasil.

Na privatização da Telebras o governo vendeu todas as subsidiárias, mas manteve durante anos (uns 15 ou mais) a Holding Telebras em “processo de extinção”. Isso permitiu que os funcionários (os que interessavam) fossem remanejados para a recém criada Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Que não teve logo de cara, na sua criação, de enfrentar processos seletivos para montar o seu corpo funcional.

Centralização de contratos de TI

Com a integração dos bancos de dados federais ocorrida ontem via decreto presidencial, o governo resolveu o problema da “Torre de Babel” que criou para si, ao permitir que todos os órgãos federais tivessem autonomia para definir os rumos da sua área de TI, sobretudo nas compras de bens e serviços.

Tendo uma única estatal de TI, gerenciando todos os bancos de dados federais que forem integrados, torna-se viável realizar compras com o foco na escolha de alguns fornecedores de bens e serviços de tecnologia. Isso seria um chamariz para atrair empresas interessadas em se tornar “sócias” do governo no capital da nova estatal, pois garantiria a possibilidade de tornarem-se fornecedoras exclusivas de bens e serviços ao governo.

É preciso lembrar que a nova estatal contará com a Lei 10.303 (a lei das estatais) que permite a formação de parcerias com entes privados, o que dispensa licitações. E se tiverem sócios privados no capital da uma estatal, em tese esses fornecedores estão dispensados de licitações na prestação de serviços para todo o governo, pois o contratante, com dispensa de licitação, será a nova estatal, e não o fornecedor em si.

Há inúmeros outros fatores que poderiam contribuir para essa pensata, mas por enquanto paro por aqui.

Nesse meio tempo vou acompanhando o que pode ser uma cortina de fumaça, essa discussão de privatizações, enquanto o governo vai amadurecendo melhor a ideia da nova estatal e comendo a oposição pelas bordas na discussão de venda das empresas.

*O que eu sei é que de tédio não deverei morrer nos próximos meses. hahaha