Por Jeovani Salomão* – Tive o privilégio de escrever um artigo com o meu amigo, e ilustre editor do Capital Digital, Luiz Queiroz, intitulado “Quero um biscoito”, cujo teor aponta algumas das fragilidades da LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados. O escrito faz parte do meu livro O Futuro é Analógico e, pelas qualidades do coautor, merece ser lido. Falar sobre o tema é sempre sensível, tanto porque a proteção dos dados pessoais é algo de extrema relevância, mas também em razão de o assunto ter se transformado em uma verdadeira fonte de negócios para consultores de tecnologia, jurídicos e empresas de software.
Quando fenômenos como este ocorrem (leis que provocam receitas), há sempre os verdadeiros beneficiados – no caso atual existe uma parcela significativa da sociedade que se enquadra nesta categoria -, favorecidos que surfam na onda do momento e aqueles que se encontram reféns do movimento criado. Enquanto cidadão, é um direito que minha privacidade seja protegida, portanto, sou absolutamente favorável quanto a necessidade de rigor de processos, métodos e dispositivos a serem utilizados pelas grandes corporações detentoras de milhões de dados. A regulação e a fiscalização são essenciais. Por outro lado, exigir o mesmo do dono do estabelecimento da esquina, e aterrorizá-lo com as ameaças da lei, já é outra história.
A polêmica atual, entretanto, é apenas a ponta, uma pontinha, do iceberg. Dois fenômenos irão levar este tema para patamares muito diferentes daqueles que estamos vivendo hoje: o 5G e o metaverso.
Cabe registrar a ocorrência bem-sucedida do leilão promovido pela ANATEL, dos dias 4 e 5 do corrente, em relação ao 5G, demonstrando que o Brasil está em um rumo sem volta para emplacar a tecnologia. Muito ainda há de ser feito, como por exemplo, um amplo ajuste nas legislações municipais para agilizar a instalação das antenas tão necessárias para o bom funcionamento da tecnologia, mas o importante é que estamos trilhando o caminho certo.
Fundamental compreender que a tecnologia 5G, assim como suas antecessoras e sucessoras, é o fator preponderante para a mobilidade. Se você pretende acessar a internet apenas pelo seu computador, ligado a um cabo de rede, você não precisa dela. Evidentemente, todos queremos estar conectados de onde estivermos, motivo pelo qual os sinais invisíveis a olho nu que ligam nossos celulares ao mundo são tão relevantes. Quanto mais rápidos, estáveis e abrangentes, tanto melhor.
Mas não são apenas nossos celulares que sem movem. Em breve, as cidades do mundo, como já acontece em algumas da China, terão os céus repletos de drones, além de carros autônomos e uma infinidade de dispositivos móveis. Significa, entre outras coisas, que a captura de imagens vai crescer a um padrão exponencial. Em resumo, sua presença em locais externos, ou mesmo dentro de ambientes fechados que tenham vista para fora, será registrada integralmente.
Sob o aspecto de segurança pública, drones providos de Inteligência Artificial, como nos filmes de ficção científica, vão efetuar um monitoramento muito mais efetivo em comparação com os padrões atuais, além de serem capazes de acionar alarmes para solicitar a intervenção necessária em cada caso. Parece bom sob um aspecto, mas e a privacidade? Sim, lembrando ainda, que se haverá drones públicos também existirão os privados, autorizados e piratas.
Vamos abordar o segundo fator, o metaverso, enquanto você digere o fato de que sua presença na rua, no futuro, será gravada, querendo você ou não. Nesta nova existência, você estará inserido em um universo virtual, representado por um dos seus avatares, relacionando-se das mais diversas maneiras possíveis. Reuniões, estudos, jogos, encontros pessoais, congressos e muito mais.
Possivelmente, se você tem participado de reuniões on-line, já deve ter sido gravado várias vezes. Pois é, o que você acredita que vai acontecer no metaverso? Seus avatares estarão em um constante big brother. Suas encarnações digitais serão gravadas pelo provedor do ambiente, pelo seu próprio dispositivo, por softwares de terceiros e pelos avatares com os quais você está se relacionando.
Em um momento inicial, com o frenesi característicos das novidades, muita gente não irá prestar atenção na exposição pessoal. Basta abrir sua rede social agora para confirmar a tese. Certamente, você vai encontrar vários amigos revelando sentimentos pessoais, momentos íntimos, encontros familiares e assim por diante.
Algum tempo depois, saturados de drones e da presença regular no mundo virtual, vamos perceber que a nossa vida privada, não apenas o CPF e o número do celular, estarão completamente disponíveis na rede. Não se assuste, portanto, quando a mensagem da cancela de entrada do shopping for algo assim: “Seja bem-vindo fulana, a loja XYZ está com uma promoção que você vai adorar, a sessão do filme que você mais vai gostar ainda tem vaga e o fulaninho de tal está na praça de alimentação!”
*Jeovani Salomão é fundador e presidente do Conselho de Administração da Memora Processos SA, Membro do conselho na Oraex Cloud Consulting, ex-presidente do Sinfor e da Assespro Nacional e escritor do Livro “O Futuro é analógico”.