Brasscom: Redata cria oportunidade do país ir além da infraestrutura tecnológica

Dados levantados pela Brasscom com base em números do Banco Central mostram que, após a pandemia, o Brasil ampliou a dependência de serviços processados fora do território nacional. Hoje, 60% dos dados brasileiros estão no exterior, o que fez o déficit na balança comercial de serviços digitais salte de US$ 2,8 bilhões em 2021 para US$ 6,8 bilhões em 2024.

Enquanto apenas 20% das aplicações no Brasil rodam em nuvem, países como os Estados Unidos já superam os 50%. Esse descompasso evidencia o tamanho da oportunidade: o país ainda tem espaço interno para expandir a cloud e, ao mesmo tempo, pode exportar serviços digitais, aproveitando gargalos energéticos enfrentados por gigantes como os EUA.

A avaliação foi feita pelo presidente da Brasscom, Affonso Nina, durante o workshop: “Horizonte Renovável: A era dos Data Centers no Brasil”, realizado em Brasília pela Aneel – Agência Nacional de Energia Elétrica. Ele falou no Painel 1: “O papel dos Data Centers no processo de transformação digital”.

A Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e Tecnologias Digitais (Brasscom), reúne cerca de 100 associados entre multinacionais, empresas brasileiras que exportam serviços, desenvolvedores de software, hyperscalers e companhias de data centers. O recado foi claro: ao impulsionar os data centers, o Brasil impulsiona toda a cadeia digital e se posiciona como player global.

Affonso Nina entende que o desafio é compreender que esses empreendimentos fazem parte de um ecossistema maior, que envolve desde engenharia e construção até software, cibersegurança, serviços financeiros, saúde, educação e, sobretudo, o usuário final que consome aplicações digitais no celular ou no computador.

Tributação e o desafio da competitividade

O executivo concordou com os demais colegas no debate, que um dos principais entraves para atrair investimentos é o custo de instalação de data centers no Brasil, hoje entre 20% e 30% mais alto do que em países vizinhos da América Latina. A razão está na carga tributária que incide sobre equipamentos importados — cerca de 85% do CAPEX dos data centers depende de produtos estrangeiros como CPUs, GPUs, storage e sistemas de rede.

O setor aposta no projeto Redata, que pretende simplificar e acelerar o regime de importações sem criar subsídios, mas garantindo previsibilidade e segurança jurídica aos investidores. A ideia é alinhar o cronograma com a reforma tributária, antecipando para 2026 os efeitos de desoneração de bens de capital previstos para 2027. “Não é o bonde que está passando, é o trem-bala. Se esperarmos até 2027, teremos perdido a janela de oportunidade”, resumiu um dos porta-vozes da entidade.

Capacidade e crescimento projetados

Hoje, o Brasil tem cerca de 800 megawatts instalados em data centers, contra 1,6 gigawatt processado no exterior. A expectativa conservadora da Brasscom é de que o país atinja entre 2,6 e 3 GW até 2030, apenas atendendo ao crescimento natural de cloud e inteligência artificial. Se souber aproveitar a janela atual, o número pode ser bem maior, com o Brasil exportando capacidade de processamento para outros mercados.

Sustentabilidade: mito e realidade

Outro ponto que gera polêmica, segundo ele, é o impacto ambiental dos data centers. Estudo divulgado pela Brasscom, em parceria com a Associação Brasileira de Data Centers (ABDC) e revisado pela Universidade Federal Rural de Pernambuco, desmonta alguns mitos.

Energia: em 2023, os data centers consumiram apenas 1,7% da energia elétrica do país. Mesmo com crescimento acelerado, esse índice não deve ultrapassar 3,6% a 4% até 2029 — valor bem inferior ao consumo de setores industriais tradicionais.

Água: a maioria dos empreendimentos usa circuitos fechados de refrigeração, semelhantes a radiadores de automóveis, o que reduz a necessidade de reposição. A projeção é que, em 2029, o consumo não passe de 0,01% da água disponível no Brasil.

Políticas públicas e regulação

Além da tributação, o setor acompanha de perto o debate regulatório. O PL 2338/2023, que trata da inteligência artificial, é visto com cautela: o receio é que eventuais barreiras legais afastem investimentos em processamento local.

Affonso Nina destacou que, para a Brasscom, é essencial que o Brasil adote políticas públicas claras, capazes de combinar atração de capital estrangeiro, incentivo à produção local de equipamentos e estímulo à formação de mão de obra especializada. “Estamos diante de uma oportunidade única: fortalecer a autonomia de processamento no país, reduzir a dependência externa e transformar energia limpa e conectividade em vantagens competitivas globais”, concluiu.