Além da modelagem: o BIM precisa estar no centro da estratégia de negócios

Por Marcus Granadeiro – Em um cenário setorial cada vez mais orientado por dados, o BIM (Building Information Modeling) deveria ser adotado pelas empresas como um importante recurso estratégico. Porém, na maioria das vezes, essa metodologia vem sendo implantada de forma isolada, sendo considerada meramente uma ferramenta ou um requisito de conformidade para entregas de projeto e, raramente, integrada a uma estratégia mais abrangente de Transformação Digital.

Essa perspectiva precisa evoluir. O sucesso do BIM não se limita a uma implementação isolada, mas sim uma jornada contínua de mudança dentro da organização. Dentro desta perspectiva, existem diversos modelos de roteiros para a Transformação Digital e o ponto central não reside unicamente na tecnologia, mas sim na reimaginação da operação empresarial. Essa alteração de mentalidade é fundamental para que as empresas do setor da construção possam usufruir plenamente do potencial do BIM.

Engajamento de todos os stakeholders para criar valor ao ciclo de vida do projeto

Um dos primeiros passos nessa jornada é compreender o cliente em sua totalidade. No contexto do BIM, o conceito de “cliente” se expande para além do dono do ativo, abrangendo todos os envolvidos que interagem com os dados ou se beneficiam deles ao longo do ciclo de vida de uma obra, como projetistas, construtores, gestores de instalações, até mesmo futuros proprietários. A armadilha a ser evitada é focar unicamente na fase de entrega do projeto, negligenciando as necessidades dos usuários pós-construção, especialmente os gestores de instalações, o que pode resultar em modelos complexos e inadequados para o gerenciamento dos ativos a longo prazo. Ao envolver todas as partes interessadas desde o princípio e entender suas demandas, o BIM pode gerar valor ao ciclo de vida do edifício, promovendo economia de custos e melhorias no desempenho.

De requisito contratual à estratégia que maximiza o valor comercial

Rever a proposta de valor do BIM é fundamental para elevá-lo de uma obrigação contratual a um modelo estratégico que eleva o valor comercial dos projetos. Posicionar o BIM como um mero requisito exigido pela licitação é uma negligência que impede as empresas de explorarem seu potencial como um motor de valor, capaz de otimizar o desempenho dos projetos e fortalecer o relacionamento com os clientes. A capacidade do BIM de aprimorar a previsibilidade, gerenciar custos e monitorar o progresso representa um valor comercial direto, resultando em melhores resultados financeiros, entregas mais ágeis e maior satisfação do cliente.

Repensando os processos para ganhar eficiência na Transformação Digital

A evolução dos principais processos de negócios é outro pilar fundamental. A Transformação Digital não se resume à adoção de novas ferramentas, mas implica em repensar a organização e a integração dos processos ao negócio. Persistir com fluxos de trabalho ultrapassados após adotar novas ferramentas BIM é uma armadilha que impede a plena exploração do potencial da metodologia para otimizar a eficiência e reduzir erros. É muito importante adaptar os fluxos de trabalho em todas as etapas, desde a coordenação e comunicação até a aquisição e o acompanhamento de projetos.

Governança de dados e integração para otimizar a gestão de ativos

A forma como as empresas repensam seus dados e a tecnologia também é crucial. O foco não deve ser apenas em adquirir mais softwares, mas em aprimorar a captura, o gerenciamento e o compartilhamento de dados ao longo do ciclo de vida de um ativo. A adoção do BIM sem uma estratégia clara de governança de dados, incluindo padrões de interoperabilidade e troca de informações, é uma armadilha que pode levar à criação de silos na informação, limitando a obtenção de insights.

Por outro lado, a capacidade de integrar dados BIM com outras fontes, como sensores e análises em tempo real, pode aprimorar significativamente a gestão e a eficiência dos ativos construídos ao longo do tempo, resultando em menores custos de manutenção, menor consumo de energia e um ativo mais sustentável.

O papel da liderança para impulsionar os negócios

Para que a proposta do BIM seja reformulada dentro das organizações, a liderança precisa desempenhar um papel fundamental na condução do BIM e da Transformação Digital. Isso porque a adoção desse modelo não envolve apenas tecnologia, mas sim o alinhamento de colaboradores e de processos com uma visão digital mais ampla.

A delegação do BIM ao departamento de TI ou tecnologia, sem o respaldo e participação da alta administração, é uma armadilha que impede o BIM de se tornar uma estratégia central, limitando seu potencial de geração de valor. Quando a liderança adota plenamente a metodologia, ela pode transformar toda a organização, não apenas impulsionando a adoção, mas garantindo o alinhamento entre as equipes para que seja liberado todo o valor estratégico em prol da obtenção de melhores resultados de negócios.

O BIM transcende a mera produção de desenhos de forma mais eficaz. Ele representa um conceito revolucionário que, quando integrado a uma estratégia de Transformação Digital, possui o potencial de gerar valor comercial significativo. Contudo, essa realização somente ocorre quando o BIM é encarado como uma mudança organizacional abrangente, que impacta clientes, processos, dados, liderança e cultura. É essencial que as empresas reflitam se suas estratégias BIM estão alinhadas com as necessidades reais das partes interessadas, se os dados são tratados como um ativo que tem valor e se a liderança está verdadeiramente comprometida em impulsionar a mudança.

*Marcus Granadeiro é engenheiro civil formado pela Escola Politécnica da USP, sócio-diretor do Construtivo, empresa de tecnologia com DNA de engenharia, membro do RICS – Royal Institution of Chartered Surveyors (MRICS) e certificado em Transformação Digital pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).