O curioso timing político do TCU

É incrível como o relógio do tempo de vez em quando acelera ou atrasa em função do timing político. Na semana passada foi divulgada uma foto de uma reunião que ocorreu entre os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Lula, sugerindo que foi selado um eventual apoio do tucano ao petista, no segundo turno das eleições presidenciais do ano que vem. FHC teria registrado esse apoio e Lula mandou divulgar a foto. Se o candidato petista estiver na disputa contra a reeleição do presidente Jair Bolsonaro, num segundo turno, tudo indica que terá o apoio do ex-presidente tucano.

Imediatamente após a divulgação da foto, as redes bolsonaristas trataram de minimizar o episódio e passaram a bombardear FHC com postagens, nas quais ambos eram mostrados como adversários políticos que viviam disparando críticas pesadas um contra o outro nas redes sociais, mas agora são “eventuais aliados”. O objetivo foi mostrar que tal “aliança” seria o “vale-tudo político” para ganhar eleições, mesmo discurso da primeira eleição de Bolsonaro.

Querendo ou não participar deste clima eleitoral que já toma conta do país, mesmo com mais de um ano de antecedência, o Tribunal de Contas da União tomou uma decisão que é, no mínimo, bastante curiosa. Publicou hoje (24/05), decisão tomada após sessão plenária do dia 12 de maio, em que multou o ex-banqueiro Salvatore Cacciola em R$ 11 mil.

A multa foi aplicada pelo TCU à Cacciola por ele ficar “protelando” com embargos de declaração o pagamento de uma multa fixada pela Corte de Contas em R$ 54 milhões, num processo que corre no tribunal desde 1999, por envolvimento dele no famoso escândalo financeiro dos bancos Marka-FonteCindam.

O escândalo dos bancos Marka-FonteCindam foi o mais rumoroso do início do segundo mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1999. FHC fez campanha prometendo manter a paridade do dólar e, reeleito, desvalorizou a moeda brasileira.

Naquele ano o Banco Central não teve mais como segurar a paridade do câmbio com o dólar que fazia com que a moeda brasileira tivesse o mesmo valor da moeda norte-americana. Era necessário desvalorizar o real, pois a Economia estava afundando nas contas externas, sobretudo, na balança comercial.

O banco Marka-FonteCindam apostava na manutenção da paridade das moedas e continuou fechando contratos no mercado futuro para pagamentos em dólar com a mesma cotação em real. Ou seja, estava correndo um sério risco de quebrar se ocorresse a desvalorização da moeda brasileira. E ela ocorreu.

Sob a alegação de “risco sistêmico” o Banco Central passou a ajudar o banco Marka-FonteCindam vendendo dólares numa cotação mais baixa do que os valores praticados no mercado financeiro. Na época tal operação gerou um prejuízo de R$ 1,5  bilhão aos cofres públicos, que a preços de hoje poderiam levar esse valor facilmente a um patamar de uns R$ 5 bilhões ou bem mais.

Salvatore Cacciola chegou a fugir para a Itália e depois foi preso, em 2007, em Mônaco. Acabou extraditado para o Brasil e foi o único condenado a cumprir pena até 2011, quando conseguiu liberdade condicional. Em 2012 a Justiça Federal no Rio de Janeiro concedeu o indulto em favor de Cacciola, com base num decreto assinado pela ex-presidente Dilma Rousseff.

Ao final o escândalo acabou em pizza, ninguém ressarciu os cofre públicos e Cacciola apenas continua respondendo por sua responsabilidade neste tribunal de contas.

Esse cenário futuro de aliança entre dois partidos que disputaram a hegemonia política entre as décadas de 1990 e 2000 deverá tornar-se num prato cheio para a campanha da reeleição bolsonarista.

E chega a ser curioso como o TCU julga um assunto em sessão do dia 12 de maio, não dá publicidade ao assunto e somente agora, no dia 24, publica a decisão no Diário Oficial da União sem nenhum estardalhaço.

Somente os olhos aguçados das equipes de campanha que já estão com o pé no acelerador em ambos os lados deverão prestar a atenção ao fato e guardá-lo como munição para ser usada mais à frente.

*Mistérios que ocorrem nos subterrâneos de Brasília. Ou, quem sabe, só “paranoia” deste repórter que vos escreve.