*Por Augusto Schmoisman – O jogo da influência no mercado global, obviamente, não é algo novo. Países, empresas e autoridades sempre influenciaram outros players fazendo uso do poder econômico e, muitas vezes, militar. Mas a era cibernética acrescentou um novo “campo de batalha” a essa guerra de influências. Agora, vivemos em uma época em que é possível roubar mais de um terabyte de dados em uma fração de segundo, por meio de um dispositivo de armazenamento móvel, vazando informações de governos, grandes corporações, sistemas de segurança e reuniões de negócios. Tudo anonimamente e em tempo real.
Com isso, assistimos nos últimos anos um aumento significativo no escopo e intensidade das guerras de informação entre as grandes potências e outras forças na arena internacional, e campanhas de influência têm se tornado uma ferramenta legítima nas mãos de políticos, propagandistas e potências globais.
Esses processos vêm sendo constantemente abordados na literatura profissional e no noticiário, com foco principalmente em redes sociais no contexto das campanhas políticas. Porém, um outro olhar que não tem recebido a mesma atenção está relacionado ao mesmo processo de influência, mas em um ambiente capaz de causar impactos bem maiores não apenas no cenário político interno, mas em diferentes mercados e numa escala internacional: a Dark Web.
A camada profunda, escondida da rede, que abriga páginas protegidas por várias camadas de criptografia, foi inicialmente desenvolvida Marinha norte-americana para fins de inteligência e, então, promovida pelo Ocidente como uma ferramenta pública para proteger a privacidade e o anonimato.
Hoje, é utilizada para diferentes fins, desde contornar as restrições à liberdade de expressão em regimes totalitários até vazamentos deliberados, muitas vezes falsos, a fim de exercer influência social, comercial e política. E muitos atores no cenário internacional estão usando a Dark Web para distribuir propaganda e desinformação sobre seus rivais, em campanhas de amplo alcance de influência.
Como um ambiente que santifica a privacidade e o anonimato, é frequentemente utilizado por criminosos, terroristas e outros elementos hostis, para a troca de informações, em uma espécie de mercado para atividades ilegais, com o comércio de ferramentas cibernéticas. Por exemplo, se uma empresa deseja causar danos a um concorrente, ele pode entrar na Dark Web, comprar um ataque com ransomware, malware ou spyware, ativar uma rede de bot ou qualquer outra ferramenta. Na maioria dos casos, o comprador e o vendedor conduzem a transação com bitcoins, para manter esse anonimato.
Algumas das plataformas que podem ser usadas para influenciar campanhas incluem plataformas de vazamento; plataformas de armazenamento de dados passivos; e plataformas de negociação, por meio da venda de informações, ferramentas de ciberataque e bots. Vários sites anônimos oferecem a compra ou venda de informações classificadas.
E não apenas as informações são negociadas nessas plataformas. Pesquisas indicam que a Dark Web está se tornando a principal fonte para o venda e distribuição de malware projetado para se infiltrar em organizações específicas e setores industriais. Malware, spyware, redes de bots e ferramentas de criptografia cibernética e de mídia, todos podem ser adquiridos na Dark Web para uso em campanhas de influência, de forma fácil e anônima.
Essas ferramentas já estão sendo usadas por países e organizações para exercer influência no ciberespaço. Com a dificuldade de rastrear a origem dos vazamentos, podemos esperar um crescimento da oferta e demanda por essas ferramentas, o que pode elevar a capacidade de causar o caos em sistemas políticos e no cenário empresarial.
*Augusto Schmoisman é especialista em defesa cibernética corporativa, militar, aeroespacial e CEO da Citadel Brasil.