Analisando o PL das Fake News (parte II)

Por Walter Aranha Capanema* – Continuando a série de textos sobre o PL das Fake News (PL 2630), eu gostaria de comentar sobre o art. 10, que estabelece o dever dos serviços “mensageria privada”[1] de armazenar as informações relativas às “mensagens veiculadas em encaminhamento em massa”.

E o que seriam “mensagens veiculadas em encaminhamento em massa”? Spam? Correntes de oração?

Na verdade, o legislador trouxe um conceito matemático, digno de normas tributárias: é o envio de uma mesma mensagem por mais de 5 usuários, no período de 15 dias, para grupos ou listas de usuários (§1º).

Por qual razão escolheram esses critérios? Jamais saberemos.

E o referido dever consiste no armazenamento não das mensagens, mas dos seus metadados, ou seja, das informações que as individualizam, como o usuário (por meio do seu número de telefone, login ou email de cadastro), a data e hora de encaminhamento e o quantitativo total de destinatários (§2º).

Esse dever de guarda de informações está restrito às mensagens que atinjam mais de mil usuários (§4º), e o seu uso será apenas para a responsabilização pelo encaminhamento de ilícitos (possivelmente na seara eleitoral), e na persecução penal, exigindo prévia ordem judicial para se acessar tais informações (§3º)

Na realidade, o legislador estabeleceu um dever de monitoramento dos usuários, estabelecendo, como atitude suspeita, a grande aceitação de um determinado conteúdo.

Os indivíduos que possuírem um discurso popular na praça das ideias digitais será recompensado pelo Estado com o seu “fichamento”.

Além de uma violação às liberdades democráticas mais importantes,, o referido monitoramento, trazido como justificativa para se identificar a autoria das fake news, em pouco contribui para a investigação.

Nada impede que uma mensagem de fake news tenha pouco engajamento, ou que sofra diversas alterações no seu reencaminhamento, o que dificultaria o monitoramento.

Se o PL dispensa a necessidade de armazenamento dos metadados nos casos em que a quantidade de destinatários seja inferior a mil usuários, como já foi dito, fica evidente que os provedores deverão monitorar constantemente TODOS os seus usuários, para verificar, assim, o alcance de suas mensagens.

A grande ironia é que esse PL se autointitula de “Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet”.

*Walter Aranha Capanema é Diretor de Inovação e Ensino na Smart3 Consultoria e Treinamento