Pasmem, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Manoel Pereira Calças (foto), justificou o contrato sem licitação de R$ 1,3 bilhão com a Microsoft, para migrar toda a base de dados da Justiça de São Paulo para a nuvem da multinacional, usando os mesmos argumentos que já se tornaram um padrão em marretas na compra de bens e serviços de informática na Administração Pública Federal.
Segundo entrevista que concedeu ao portal Conjur (Consultor Jurídico), a dispensa de licitação que levou a Microsoft a conseguir o maior contrato em valores no Brasil, ocorreu porque, segundo ele, o Google e a Amazon Web Services “não atenderam especificações técnicas desejadas”.
Mas quem atestou isso, para o TJSP partir para a compra direta do serviço na Microsoft?
Na entrevista o presidente do TJSP alega que baseou sua decisão “em parecer técnico elaborado pela Fundação Arcadas, da USP”. Ahhh bom, então alguém atestou do ponto de vista técnico, que o Google e a AWS não atendiam às especificações técnicas e que somente a Microsoft teria essa condição.
Certo? Errado.
No site dessa Fundação, fica claro que do ponto de vista “técnico” ela não teria, jamais, condições de atestar que o Google ou a AWS não atendem às especificações do TJSP. Segundo sua própria apresentação em seu site, a Fundação Arcadas, de apoio à Faculdade de Direito da USP, foi criada “por um grupo de professores da Academia de Direito do Largo São Francisco, com finalidade cultural e de desenvolvimento da educação e da Ciência do Direito”.
Até agora as únicas coisas claras nesse episódio são:
1 – a área de TI do TJSP queria dar uma banda na detentora do contrato do “e-SAJ”, fornecido pela empresa brasileira Softplan e,
2 – que o Conselho Nacional de Justiça ao verificar a marreta baixou liminar sustando a contratação direta, sob argumento do conselheiro Márcio Schiefler, de que o TJ de São Paulo não poderia ter dispensado licitação para contratar o serviço. E não poderia ter escolhido outro programa sem autorização do CNJ, que definiu um padrão de sistema para o Judiciário brasileiro.
O presidente do TJ/SP afirmou ainda que “tudo foi feito para proteger a inovação e garantir que o tribunal tenha tecnologia de ponta disponível”.Ora, se era para favorecer a “inovação”, tenho certeza de que pela metade do preço que pagará à Microsoft, o tribunal teria condições de investir num projeto de inovação interno da sua área de informática, para torná-la capaz de ser autossustentável tecnologicamente.
Não está tão claro também, que o TJSP obedeceu rigidamente o que estabelece “os limites da Lei de Licitações, da Lei de Acesso à Informação e da Lei de Inovação, sempre com base no parecer da USP”. Primeiro, porque o parecer de uma Fundação de Advogados deixa muito a desejar do ponto de vista técnico ou tecnológico. Segundo, porque nunca ouvi falar que a Lei de Licitações garante que uma cotação de preços de serviços pode sustentar a decisão de se dispensar uma licitação.
Resta ainda uma pergunta no ar: Como o judiciário brasileiro pode explicar a decisão de trocar um projeto que vem sendo executado por uma empresa genuinamente nacional, ao custo em torno de uns R$ 100 milhões, por um contrato com uma multinacional que pagará R$ 1,3 bilhão?
*Tem cheiro de marreta, tem cara de marreta. Falta agora o CNJ comprovar se é ou não a maior marreta de 2019 na área de informática.